Raquel Montero

Raquel Montero

quarta-feira, 30 de março de 2016

Representantes da OAB e um posicionamento que não representa

  


Segunda-feira, 28 de março, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) protocolou na Câmara dos Deputados mais um pedido de impeachment contra a Presidenta Dilma. E em Ribeirão Preto, representantes da OAB foram pedir apoio institucional da Câmara de Vereadores para o impeachment.



  A atitude dos representantes da OAB foi criticada até pelo Presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha, mesmo sendo este fervoroso defensor do impeachment contra a Presidenta. Em tom jocoso o deputado disse que o pedido feito pelos representantes da OAB veio um "pouquinho atrasado, com retardo".



E em Ribeirão o pedido de apoio feito na Câmara foi negado através da aprovação de uma moção de repúdio ao pedido de impeachment feito por representantes da OAB. Uma derrota vergonhosa para esses representantes já que até mesmo vereadores de muitos partidos diferentes, inclusive partidos de oposição ao partido da Presidenta, repudiaram o pedido de apoio feito pelos representantes da OAB. Muitos vereadores, inclusive, nem participaram da votação, não apertaram nem a tecla "abstenção", preferiram mesmo desprezar o pedido.


Foto: Jornal Tribuna - Representantes da OAB protocolando pedido de apoio para o impeachment



  Sob este ângulo, de quem defende o impeachment, a atitude foi errada por estar "atrasada e retardada". Mas para quem é contra o golpe, chamado por alguns de impeachment, a atitude foi grotescamente errada por vários outros aspectos mais legítimos e menos jocosos. A ver;



Primeiro, o fundamento: o pedido de impeachment está errado porque não tem fundamento constitucional, jurídico, nem legal. A Constituição Federal estabelece de maneira clara as hipóteses em que se pode pedir o impeachment, e a Presidenta Dilma não se enquadra em nenhuma delas.  



  Depois a maneira com que foi feito: devemos constatar que o pedido feito não é da OAB, mas sim de representantes atuais da entidade. Dizer OAB é dizer que todos os membros que compõem a categoria teria endossado o pedido. Mas não foi isso que aconteceu. Talvez metade, ou mais da metade dos advogados e advogadas que estão devidamente inscritos na OAB não concordam com o pedido de impeachment, então como dizer que foi a OAB que fez o pedido? Não foi. Foram os representantes atuais da entidade que fizeram o pedido, o que é bem diferente de dizer que foram todos os advogados e advogadas do Brasil.



O pedido então não representa a vontade de todos os advogados e advogadas,  representa a vontade dos representantes atuais da entidade. Mas também de nem todos os representantes já que muitos representantes se colocaram contra este posicionamento da OAB, e as milhares de manifestações contrárias de advogados e advogadas ao posicionamento proferido pelos representantes corroboram essa afirmação. A divergência com o posicionamento dado pelos representantes foi tamanha que começou-se até a falar de "racha e fissura na instituição".


Eu, como advogada, gostaria que essa diferença ficasse bem clara para as pessoas. Uma coisa é a instituição, a OAB e suas nobres funções institucionais, outra coisa é o que representantes fazem da instituição e de suas funções. O que fazem pode ser analisado com admiração ou com lamento e indignação. Como é a situação atual.



Para que os atuais representantes da entidade pudessem proferir o posicionamento que proferiram, de apoio ao impeachment contra a Presidenta, deveriam, antes, ter consultado a categoria que representam, cada um de seus milhares de advogados e advogadas. E só após a consulta, proferir um posicionamento. Ou, se não quisessem consultar a todos, que não proferissem posicionamento algum em nome da entidade.



Representante, como já diz a palavra, só representa, não fala por si. Representa a vontade do representado, e assim sendo, para representar a vontade do representado deve antes saber qual é essa vontade, senão estará exercendo a sua própria vontade em descumprimento às regras do mandato de representante que lhe foi conferido.


Consulta pública, audiência pública, iniciativa popular, plebiscito e referendo não são institutos excepcionais num Estado Democrático de Direito, ao revés, são regras, notadamente quando exercidas por advogados e advogadas, de quem se espera o conhecimento e a defesa da legalidade, da democracia, de suas instituições e princípios.


Então como pode representantes da Ordem dos Advogados do Brasil não observar institutos tão democráticos, e estes mesmos proferirem posicionamento de tamanha envergadura que é um pedido de impeachment contra um Presidente da República sem antes ouvir sua própria categoria?


Se para os próprios parlamentares que criam leis para valer em todo o território nacional e para todas as pessoas que nele estão, abrangendo ai os advogados e advogadas e a OAB, se para eles mesmos está preconizado na Constituição Federal que o poder emana do povo e que a soberania popular será exercida pelo sufrágio, plebiscito, referendo e iniciativa popular, o que dirá para uma entidade de classe que existe dentro desse Brasil imenso?


Se as mais importantes mudanças e transformações a serem propostas no Brasil devem estar subordinadas à vontade de seu povo, por que julgam representantes da OAB que suas decisões não devem passar pelo crivo da categoria que meramente representam?


Erraram todos os representantes da entidade que assim agiram, se posicionando a favor do impeachment da Presidenta Dilma sem antes ouvir todos os milhares de advogados e advogadas que também fazem parte da mesma entidade. Erraram grotescamente, assim como também erraram em 64 e contribuíram para mais de 20 anos de sofrimento e torturas no Brasil.


 Mas o tempo é implacável e sabe dar respostas a tudo, como sabe também reconhecer seus heróis e deixá-los emblemáticos, e desprestigiar vilões, deixando-os no esquecimento da história de glórias. Nesse sentido, como é mesmo o nome do Presidente da OAB em 64?

     Raquel Montero


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