Raquel Montero

Raquel Montero

terça-feira, 25 de junho de 2019

A QUEM INTERESSA ACABAR COM CONSELHOS DE PARTICIPAÇÃO POPULAR?

Foto: Reprodução


Está chegando o dia 28 de junho, data estabelecida pelo Governo Bolsonaro (PSL) para a extinção, vigência de novas regras e limitações para colegiados da Administração Pública Federal. As medidas são decorrentes do Decreto Federal nº 9.759 de 11 de abril de 2.019.
 
Pelo Decreto, ao menos 35 conselhos devem ser extintos a partir de 28 de junho de 2019. Entre eles estão o Comitê Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Conatrap); Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae); Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de LGBT (CNCD/LGBT); Conselho Nacional dos Direitos do Idoso (CNDI); Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Conade); Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena; da Comissão Nacional de Florestas (Conaflor); Conselho da Transparência Pública e Combate à Corrupção (CTPCC); Conselho Nacional de Segurança Pública (Conasp); Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT); Comissão de Coordenação das Atividades de Meteorologia, Climatologia e Hidrologia (CMCH); Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (Conad); e Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).
 
Da análise dos Conselhos a serem extintos ou terem seu exercício limitado ou engessado, se pode perguntar; "mas por qual motivo se extinguiria Conselhos dessa natureza, já que todos os assuntos a que se destinam são de relevância?"
 
Pois bem, da exposição de motivos do Decreto, constata-se que as justificativas para a extinção dessas instâncias participativas se relacionam com desburocratização, simplificação administrativa, desregulamentação e contenção de gastos e despesas. No entanto, explicitamente reconheceu-se que uma das suas principais motivações foi o de conter a atuação do que o Decreto chamou de "Grupos de Pressão", “tanto internos quanto externos à Administração, que se utilizam de colegiados, com composição e modo de ação direcionados, para tentar emplacar pleitos que não estão conforme a linha das autoridades eleitas democraticamente”.
 
 
Em outras palavras, o Decreto de Bolsonaro visa conter ou impedir opiniões contrárias ao seu Governo. Está no texto do Decreto tal finalidade. Só a transcrevi aqui. Tal justificativa revela-se resultado de um olhar míope e um entendimento equivocado ou deturpado sobre o que são, de fato e de direito, instrumentos e instituições participativas.
 
 
 Instrumentos e instituições participativas, como os Conselhos, são meios que a nossa Constituição Federal estabeleceu para se possibilitar a participação e fiscalização popular na elaboração e execução de políticas públicas em todos os assuntos de interesse público, e em nenhum momento da trajetória emancipatória desses mecanismos na recente redemocratização brasileira se pretendeu contrapor, ou mesmo substituir, a representação política das eleitas e dos eleitos pelo povo pela participação popular na gestão pública ou pelo controle social que muitas dessas instâncias acabam também por concretizar na estrutura estatal, ao contrário, esses instrumentos - representação do povo e participação popular - se complementam, não se excluem, nem se substituem.
  
 
A Constituição Federal de 1988 prevê a participação popular na gestão pública como pressuposto do sistema democrático. Os conselhos foram criados a partir dessa diretriz constitucional. Os Conselhos possibilitam a elaboração, gestão e execução compartilhada de políticas públicas, desde o âmbito municipal até o federal, são canais que permitem, num mesmo espaço e ao mesmo tempo, o diálogo entre as/os representantes eleitos pelo povo com membros da sociedade, e a sociedade sendo representada por membros dos mais diferentes setores, entidades e coletivos, permitindo, assim, o exercício da cidadania e a escolha democrática das medidas e soluções a serem aplicadas nos assuntos a serem resolvidos pelo governo. E dessa forma, com participação popular nas decisões públicas, fortalecemos a cidadania e aprofundamos na democracia, além de termos maior probabilidade de que as decisões tomadas tragam de fato soluções e progressos, já que os destinatários das políticas públicas foram ouvidos.
 
 
Se os assuntos são de interesse público e destinados à população, e se quem remunera obras e serviços públicos é o povo, só não quer participação popular quem não quer ser fiscalizado, e só não quer ser fiscalizado quem não quer fazer direito. Em qualquer lugar do mundo com mais participação e fiscalização a política funciona melhor, por que aqui seria diferente?
 
 
Contra o Decreto, várias reações foram emitidas na sociedade, dentre elas uma Ação Direta de Inconstitucionalidade foi feita pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e o Ministério Público Federal emitiu uma nota técnica, sustentando sua inconstitucionalidade. Na sequência, o Supremo Tribunal Federal em julgamento desse mês já limitou o alcance do Decreto, impedindo a extinção de vários conselhos. E foi justamente a participação popular que provocou essas reações. Continuemos!
 
       Raquel Montero 

sexta-feira, 7 de junho de 2019

PRIVATIZAR O AEROPORTO LEITE LOPES AO INVÉS DE VALORIZÁ-LO?

Artigo também publicado no Jornal Tribuna, na edição do dia 07 de junho de 2.019. No Jornal Tribuna o artigo pode ser acessado também pela internet, no link;



Foto: Reprodução


O Governo do Estado de São Paulo, sob a gestão do atual Governador João Dória (PSDB), cumprindo com a promessa feita por Dória de privatizar tudo o que puder no Estado de São Paulo, aterrissou agora sobre os aeroportos, visando privatizar os 20 (vinte) aeroportos estaduais. O aeroporto de Ribeirão Preto/SP, Doutor Leite Lopes, é um deles e está na primeira fase de visitas dos aeroportos a serem visitados visando a privatização.

Com relação ao Leite Lopes o Governo ainda irá definir se será privatização, concessão ou parceria público-privada. Além do Leite Lopes, três ae­roportos estão na lista desta pri­meira fase de visitas, quais sejam, o aeroporto dos municípios de Presidente Prudente, de Araçatuba e de São José do Rio Preto, e, na sequência, o de Bauru, de Marília, de São Carlos e de Sorocaba.
Dória querendo privatizar tudo o que puder, conforme ele mesmo já declarou, e países de grande economia, inclusive países centrais do capitalismo, como Estados Unidos (EUA) e Alemanha, estatizando ou reestatizando serviços e empresas.
 
 
A China, que é o pais com a mais dinâmica economia do mundo nas últimas décadas, é também o Estado que possui a maior quantidade de empresas estatais, aproximadamente 150 mil empresas estatais, sendo 55 mil delas diretamente subordinadas ao Governo Federal e atuantes nos mais diferentes setores. As estatais coreanas são em torno de mais de 300, segundo dados de 2.018. O Vietnã tem 781 empresas estatais nas quais o Estado é o único sócio. EUA tem cerca de 7 mil estatais, algumas das quais entre as maiores forças econômicas do mundo em 2.018, como Fannie Mae Freddie Mac. A Alemanha, até 2.014, detinha um total de 15.707 estatais nos mais diversos níveis da federação.
 
A Bolívia tem cerca de 30 estatais que representam cerca de 40% do PIB nacional, e tem 11 milhões de habitantes, e embora seja um dos países mais pobres da América do Sul é um dos que mais crescem no continente, e seu crescimento está diretamente ligado com a reestatização de serviços prestados em seu país.
 
 
Em 2.018 o valor dos ativos de uma das estatais norte-americanas do setor de hipotecas se equipara ao PIB do Brasil (US$ 2 trilhões), já o da outra quase que o supera em duas vezes. Das dez maiores empresas do mundo, tendo-se como referência o valor total do ativo detido, em 2.018, 60% são empresas estatais pertencentes a China, EUA e Japão. Tais conglomerados estatais superaram gigantes da tecnologia da informação, da indústria farmacêutica ou da indústria do entretenimento como Apple, Facebook, Amazon, Microsoft, Bayer e Walt Disney.
 
 
E além desses países de grande economia e centrais do capitalismo, terem, defenderem e valorizarem suas estatais, eles ainda têm estatais multinacionais que atuam em outros países, gerando mais riqueza para os proprietários das multinacionais, como a China que tem 257 estatais multinacionais, a Índia que tem 61 estatais multinacionais, a África do Sul com 55, a Rússia com 51, a França com 45, a Alemanha com 43.
 
 
E diante desse cenário, há governantes brasileiros, como Dória, que além de não defenderem e valorizarem as estatais brasileiras, ainda falam mal delas, a boicotam e a sucateiam, visando preparar terreno para fundamentar uma privatização. A privatização é ruim e estes mesmos que a defendem reconhecem isso, e tentando amenizar o estrago, ao invés de falarem privatização, falam em verborragia, "desestatização".
 
 
Mas não nos deixemos iludir, na prática, em resumo, quando se transforma algo público em particular o que acontece é a perda de mais um patrimônio público, a cobrança de valores mais altos pelos serviços prestados e a priorização do lucro, além dos serviços não melhorarem, ao contrário, como a realidade vem mostrando, na maiorias dos casos, os serviços privatizados pioram, como a telefonia.
 
Raquel Montero

segunda-feira, 3 de junho de 2019

Entrevista para a Revista Revide

Em excelente matéria deste sábado, 01 de junho de 2.019, da Revista Revide fui entrevistada para falar sobre os gastos com publicidade (ou propaganda) que a Prefeitura de Ribeirão Preto está fazendo. Veja na matéria como esses gastos estão sendo negativos e contraproducentes para o erário e a população.
A matéria também pode ser vista no site da Revista Revide, através do link;

https://www.revide.com.br/noticias/cidades/prefeitura-de-ribeirao-preto-gasta-mais-com-publicidade-do-que-com-manutencao-eletrica-em-escolas/?fbclid=IwAR3sqlfog7sWNQfjvhby-MYhgSX639Q8w4tXokNDOmzsef9DI88DxQY_auw
Revide, Prefeitura gasta mais com publicidade do que com manutenção de escolas, publicidade, prefeitura, ribeirão, preto, duarte, nogueira, obras, versão, br, propaganda, valor, estudante, morto, escola
Em novembro de 2018, um estudante morreu dentro de uma escola sob suspeita de choque elétrico

Prefeitura gasta mais com publicidade do que com manutenção de escolas

Executivo municipal pagou R$ 7,9 milhões para empresa divulgar obras no município

   
A Prefeitura de Ribeirão Preto gastou R$ 7,9 milhões com uma empresa de publicidade entre janeiro de 2018 e maio de 2019. O valor é mais que o dobro dos R$ 2,9  milhões prometidos pela Secretaria da Educação para o reparo hidráulico e elétrico de todas as escolas da cidade. Além de representar cerca de 80% do que a Prefeitura pretende gastar com todos os tipos de reparos e manutenções nas 109 escolas municipais em 2019. 
Os R$ 7,9 milhões foram gastos com uma única empresa que presta serviços de publicidade, como a criação de sites, outdoors entre outras mídias. Ao todo, o Executivo pagou R$ 5,4 milhões em 2018 e mais R$ 2,5 milhões nos cinco primeiros meses de 2019. Nesse montante, não estão inclusos valores repassados para outros tipos de publicidade, como a veiculação de licitações em jornais e diários oficiais.
A empresa contratada, a Versão BR Comunicação e Marketing, é a responsável pela campanha de marketing do programa “Ribeirão Mobilidade”. Dentre as mídias que a companhia utilizou para a veiculação dos informes, estão outdoors espalhados pela cidade, anúncios nas redes sociais e no aplicativo cittamobi, além de um site próprioda campanha.
Nenhuma das peças apresenta o valor pago pelo serviço publicitário e nem faz menção à empresa que realizou o serviço. Utilizando sistemas de busca de registros na internet é possível confirmar que o site “Ribeirão Mobilidade” foi criado pela Versão BR no início de maio deste ano.
Outro lado
Por meio de nota, a Prefeitura informou que a campanha encontra-se em execução e ainda "não foram apresentados os processos referentes a esse trabalho". Apesar da campanha já ser visível nas ruas da cidade e na internet, o Executivo informou que, assim que as informações sobre o trabalho forem divulgadas pela empresa publicitária, elas serão disponibilizadas no site “Publicidade Transparente” em até 30 dias após o processamento. O site no qual serão prestadas as contas, entretanto, também tem como titular a Versão BR.
Como justificativa, a Prefeitura cita um trecho da lei federal 12.232/2010, que dispõe sobre a contratação de empresa publicitárias. “As informações sobre a execução do contrato, com os nomes de fornecedores de serviços especializados e veículos, serão divulgadas em sítio próprio aberto para o contrato na rede mundial de computadores, garantindo o livre acesso às informações por quaisquer interessados".
Todavia, a administração pública não respondeu à reportagem: quantos outdoors foram ou serão feitos, por quanto tempo eles ficarão expostos, qual o valor gasto por outdoor, qual o valor gasto com outras mídias, e se acredita que o montante investido em publicidade está de acordo com a realidade financeira do município. O Portal Revide também tentou, por uma semana, contato com a Versão BR. Contudo, nenhum questionamento enviado pela reportagem foi respondido até o fechamento desta matéria. 
Comparações
Em março, durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara dos Vereadores que apura problemas estruturais nas escolas da cidade, a ex-secretária da Educação, Luciana Andrade Rodrigues declarou o valor que seria investido para sanar os problemas de segurança.
Segundo a ex-secretária, com a aprovação do orçamento para a pasta da Educação em 2019, serão investidos R$ 3, 7 milhões em manutenção hidráulica e elétrica nas escolas. Além de R$ 9 milhões para manutenção geral. Em novembro de 2018, um estudante morreu sob suspeita de ter levado um choque elétrico dentro de uma escola municipal.
Após a realização da licitação, o Executivo chegou obteve a proposta de R$ 2,9 milhões para a manutenção elétrica e hidráulica e R$ 6,9 milhões para  manutenção geral. Neste quesito, estão inclusos serviços como: movimentações de terra, demolições, impermeabilizações,  reforma de telhados, paredes e muros, pisos, entre outros. A Secretaria da Educação ainda aguarda a assinatura do contrato. 
Quando primeiro edital para a contratação do serviços de publicidade em 2018 foi aberto, o Portal Revidepublicou uma matéria comparando que o valor a ser investido, até então R$ 6,6 milhões, seria o suficiente para recapear 36 km de ruas na cidade.
Além disso, o montante repassado para publicidade desde 2018, é 10 vezes maior que todo o orçamento da pasta do Turismo para 2019 em Ribeirão Preto. E representa 50% de todo o investimento em Cultura no município neste ano.
Análise
Especialistas consultados pelo Portal Revide não descartam a importância e a obrigação legal da publicidade. A Constituição Federal exige que a administração pública seja regida por alguns princípios, dente eles, o da publicidade. Contudo, apontam para o uso indiscriminado dessa ferramenta.
Segundo o publicitário e doutor em Análise do Discurso pela Ufscar, João Flávio de Almeida há uma diferença entre os termos “publicidade” e “propaganda”. "A noção de publicidade é tornar algo público, por exemplo, 'vendo carro por R$ 20 mil'. Já a propaganda está ligada à persuasão. Seria algo como 'vendo este lindo carro por R$ 20 mil'", explica Almeida.
Para o publicitário, a Prefeitura fez uso de um mecanismo legal, que é o princípio da publicidade, para criar uma propaganda. Almeida usa como exemplo a frase "obras que mudaram a sua vida". Se fossem puramente anúncios publicitários do poder público, deveriam evitar adjetivos no texto.
Por outro lado, para o ex-presidente do Observatório Social, Márcio Minoru o anúncio da Prefeitura poderia ser taxado como propaganda política, do ponto de vista legal, apenas se a peça apresentasse ligação com a imagem do prefeito ou do partido político. Minoru atenta também para o artigo 37 da Constituição Federal, que esclarece os limites da publicidade na administração pública.
No referido artigo, consta a seguinte explicação: “A publicidade de atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos".
Todavia, ainda segundo Minoru, muitos governantes “passam do limite”, e se aproveitam de brechas na lei para realizar propaganda indevida. “O problema é que muitos passam do limite, mas poucos são responsabilizados", conclui.
A advogada Raquel Monteiro também enaltece a importância do artigo 37 da Constituição. "A administração pública deve publicar seus atos de maneira transparente para que a população possa acompanhar e fiscalizar. Contudo, a publicidade tem como finalidade ser benéfica para a população, e não onerosa", adverte.
Para Raquel, o poder executivo deve ponderar se a publicidade atende ao caráter “educativo, informativo ou de orientação social”, como previsto em lei, e se o custo benefício é o adequado.
Além da publicidade, a advogada também analisa o princípio da impessoalidade.  “A publicidade da administração pública deve ser feita sem qualquer promoção pessoal do governante. Não é o prefeito que faz determinada obra, mas sim, a prefeitura”, esclarece.
Foto: Luan Porto