Raquel Montero

Raquel Montero

sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

A AMAMENTAÇÃO EM LOCAIS PÚBLICOS É UM DIREITO


  O artigo abaixo também foi publicado pelo Jornal Tribuna em sua edição do dia 20.12.2019. No Jornal Tribuna o artigo também pode ser acessado pela internet através do link:




Foto: Reprodução



A ignorância é um mal, o pior deles, que pode levar pessoas a cometerem barbáries que, depois, causam vergonha quando se avança na escalada do conhecimento. Assim ocorreu recentemente com um fato que (ainda) foi motivo de ações e reações. O fato se refere à amamentação pública da mãe com o bebê, que dessa vez envolveu a atriz Isis Valverde, outrora foi com a ex-deputada e que foi candidata a vice-presidenta, Manuela D´Ávila, entre tantas outras Marias e Clarices no solo do Brasil e do mundo, que já foram vítimas de ofensas pelo fato de estarem amamentando seus bebês em público.

 
Por que isso incomoda alguns homens? Por que o peito descoberto que amamenta incomoda e o peito descoberto do carnaval, das novelas, das propagandas de cerveja, não incomoda essas mesmas pessoas? A começar do princípio, por que o homem pode andar com o peito descoberto e a mulher, amamentando ou não, é censurada por isso?

 
O aleitamento materno é um direito da criança e da mãe. Segundo o renomado médico Drauzio Varella, para o bebê não existe alimento mais completo que o leite materno, que contém todos os nutrientes necessários para garantir o crescimento saudável da criança. Além disso, olhos nos olhos, mãe e filho estabelecem a primeira linguagem efetiva de amor, que une em ligações de afeto e afinidade o bebê e a mãe como nenhum outro alimento faz (https://drauziovarella.uol.com.br/videos/series-e-documentarios/amamentacao-sem-culpa-episodio-3/). Por outro lado, crianças não amamentadas no peito estão mais suscetíveis a certas doenças, como diarréia, otites, pneumonias, aterosclerose, câncer, obesidade diabetes. A amamentação também protege a criança de má oclusão dentária, de ser uma respiradora bucal e das doenças que decorrem por causa disso.

 
A Organização Mundial de Saúde recomenda que a criança seja alimentada exclusivamente pelo leite materno por seis meses, e quando completada por outros alimentos seguros e saudáveis a amamentação pode ser estendida por até 2 anos ou mais. 
 

Se tratando o aleitamento materno do alimento mais completo e saudável para a criança, e, ao mesmo tempo, sua ausência levando a consequências prejudiciais à criança, como contestar tal dádiva da vida, quando esta só deveria receber gratidão? É a janela suja da ignorância que estando sujos seus vidros faz com que se veja sujeira na paisagem vista através dela, e ao limpar seus vidros verifica-se que a sujeira não estava fora, mas no vidro através do qual se olhava a paisagem.

 
Visando combater a ignorância e proteger o aleitamento materno leis foram feitas em vários lugares do Brasil garantindo o direito de amamentação em locais públicos e privados, como um ato livre e discricionário entre mãe e criança. A lei existe no Estado de São Paulo, nº 16.047 de 2.015, e estabelece multa a quem não respeitar esse direito. Lei com a mesma finalidade para valer em todo o Brasil está tramitado na Câmara Federal.

 
O ato de nos alimentarmos é um momento de respeito, por isso mesas são preparadas e ambientes organizados. Com tais preparos se faz reverência a tudo que foi feito até que o alimento chegasse ao nosso prato; a natureza que o proporcionou, as pessoas que o cultivaram, que o fizeram circular e que o cozinharam. E no ato propriamente de comer, ninguém cobre o rosto para fazer isso ou se esconde em um banheiro ou outro lugar isolado, então, por que com um bebê deveria ser feito isso? Um bebê não senta à mesa e não tem hora para sentir fome, ele simplesmente sente e quer ser amamentado, e cabe somente à sua mãe decidir onde quer amamentá-lo.
 

É certo que este acontecimento da vida e que marca o início do desenvolvimento de uma vida aconteça sendo coberto por um pano ou escondido em algum lugar porque algumas pessoas sexualizam esse ato de ternura e amor? Qualquer maldade que se veja no ato de amamentar é como o vidro sujo da janela. A maldade está em quem sexualiza um ato de amor. E se quem sexualiza a amamentação é o homem,  por que a mulher é que tem ser censurada no ato de amamentar? Que jorre água no vidro sujo da ignorância.

 
     Raquel Montero 

quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Isso é racismo


Artigo publicado também no Jornal Tribuna na edição do dia 13.12.2019, pelo site Justificando na edição do dia 16.12.2019 e no site GGN de Luis Nassif no dia 21.12.2019. 

No Jornal Tribuna o artigo pode ser acessado também pelo site do Tribuna na internet e através do link;

https://www.tribunaribeirao.com.br/site/isso-e-racismo/


No Justificando o artigo pode ser acessado no link;




Fotos/Imagem: Reprodução



"A escravidão permanecerá por muito tempo como a característica nacional do Brasil." Assim disse Joaquim Nabuco (O Abolicionismo, Joaquim Nabuco, BestBolso, 2010, Rio de Janeiro), o principal abolicionista brasileiro. A realidade dos tempos hodiernos demonstra que a frase de Joaquim Nabuco foi uma profecia, que, lamentavelmente, se realizou.


A escravidão das pessoas negras no Brasil acabou formalmente em 1.888. O Brasil foi um dos países que mais demorou para aboli-la. Todavia, apesar da abolição formal da escravidão, feita através da Lei Áurea, ainda hoje temos denúncias de trabalho escravo. Em razão disso, inclusive, é que houve a Emenda Constitucional nº 81 de 2.014, estabelecendo a expropriação de terras onde houver trabalho escravo. Isso em 2.014, cento e trinta e um anos após a abolição da escravidão ainda estamos usando de instrumentos para combatê-la.


Neste pântano de águas contaminadas restou ainda ao Brasil raízes profundas e podres de uma erva daninha que insiste em existir; o racismo, da qual decorre a idéia escravocrata. Ha quem o negue, e dentre eles até mesmo pessoas negras como o jornalista Sérgio Nascimento de Camargo que foi nomeado pelo Governo Bolsonaro presidente da Fundação Palmares, e poucos dias depois a nomeação foi cancelada judicialmente, por entender o magistrado que havia excesso nas declarações de Sérgio sobre a inexistência de racismo no Brasil. Na decisão o magistrado escreveu; “Não serão aqui repetidos alguns dos termos expostos nas declarações em frontal ataque às minorias cuja defesa, diga-se, é razão de existir da Instituição que por ele é presidida”.


Há os que não falam do assunto, mas seus atos falam, como Silvio Santos. Em seu programa no último domingo, numa competição de candidatas cantoras, o público, por maioria exorbitante, escolheu uma negra, Jennyfer Oliver, que recebeu 84 votos, e as demais 03 candidatas brancas, não receberam nem 10 votos cada uma. Ignorando a escolha do público e quebrando as regras do jogo, Silvio Santos escolheu uma candidata branca como a ganhadora e disse; "Se eu estivesse em casa, vendo o programa, na minha opinião, a melhor intérprete na televisão seria Juliani. Você é muito bonita, canta bem. Você ganhou".


Entre opiniões e discursos estão os fatos. E os fatos nos mostram que embora pessoas negras sejam a maioria da população brasileira, correspondendo a 55,8% da população, elas são sempre a minoria nos espaços de poder e ascensão.  Desde o ensino fundamental e médio, quantas eram as pessoas negras dentre alunas e alunos, professoras e professores? E na universidade? No posto de saúde ou convênio médico, dentre médicas e médicos, no forum, dentre juízes e juízas? Quantas vezes tivemos uma pessoa negra presidente do Brasil? E governador ou governadora? A maioria das pessoas que apresentam jornais são pessoas negras ou brancas? E nas propagandas da televisão, nas novelas, nos filmes, nos desenhos? E neste último caso quando pessoas negras aparecem, com raras exceções, elas são colocadas em papéis subalternos ou de personagens maus.


Por outro lado, quando se trata de trabalhos considerados inferiores pela sociedade e pelo mercado, e que são bem menos remunerados, a situação muda, e pessoas negras são a maioria, como ocorre com as domésticas, os motoristas de ônibus, as pessoas que fazem a limpeza, os coletores de lixo, os atendentes de açougue do supermercado, o frentista, o entregador, o segurança, as pessoas que estão no semáforo pedindo dinheiro, as pessoas contratadas pela prefeitura para varrerem as ruas, os pedreiros da construção civil, a babá, o garçom e a garçonete.


Se as pessoas negras são a maioria da população por que as pessoas brancas é que mais aparecem nos espaços de poder e ascensão e as pessoas negras são exceções nesses espaços? Poderia alguém responder que seria em razão de mais instrução, já que pessoas negras foram minoria já no ensino fundamental e médio. Porém, segundo o IBGE, em levantamento de 2.018, nem mesmo quando o nível de instrução é igual entre pretos, pardos e brancos a disparidade desaparece. Os brancos com nível superior completo ganham, por hora, 45% a mais do que os pretos ou pardos com a mesma escolaridade.


Essa diferença tem outra justificativa senão a discriminação pela cor da pele, também chamada de racismo?

       Raquel Montero 

sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

A PM CUMPRE COM SUA FUNÇÃO QUANDO RESULTA VIOLÊNCIA DE SUAS AÇÕES?

Artigo também publicado no Jornal Tribuna em sua edição do dia 05.12.2019. No Jornal Tribuna o artigo pode ser acessado no link;


Foto: Reprodução: Midia Ninja/Daniel Arroyo/Ponte Jornalismo




"A única coisa que as mãos do Ocidente ensinaram ao mundo, com as letras de fogo, foi que a violência não leva nem à paz nem à felicidade. O culto à violência não tornou felizes, nem melhores, aqueles que com ela entraram em contato."
 
 
Essa frase é de Gandhi, o apóstolo da não-violência que passou sua vida a propagar a não-violência pelo mundo, a ahimsa. Gandhi também disse que "a humanidade só pode ser salva pela não-violência, que é o ensinamento central do Cristianismo" (Humberto Rohden, Mahatma Gandhi, o Apóstolo da Não-Violência, Martin Claret, 2.007, pag. 161). Nesta segunda frase Gandhi ainda faz referência a Cristo como mais um fundamento para a não-violência.
 
 
Jesus, segundo a história contada,  levou os ensinamentos do Pai para a humanidade e a essência desses ensinamentos é o amor, e como corolário dele, a não-violência. Jesus teria lutado contra injustiças e enfrentado arbitrariedade de autoridades usando como armas o amor, a igualdade, a fraternidade e a justiça social, se tornando mestre e líder em decorrência destes ensinamentos e no qual foi o primeiro a praticá-los, dando sua própria conduta como exemplo, seu aniversário é comemorado todo ano há mais de dois mil anos.
 
 
Gandhi se tornou um líder mundial com sua mensagem de não-violência e desobediência civil contra injustiças, e cuja mensagem mostrou-se uma revolucionária estratégia de transformações sociais, através do qual Gandhi, junto com a união do povo, libertou a Índia da exploração e dominação que sobre ela exercia a Inglaterra.
 
 
 Dois exemplos, para que fiquemos apenas em dois exemplos. Agora, os opostos. No Brasil, a começar pelo atual Presidente, Jair Bolsonaro, o próprio Jesus o contradiz. Bolsonaro se diz cristão, tendo como slogan a frase "Deus acima de todos", e, ao mesmo tempo, tem como slogan uma arma de fogo, ainda que Jesus tenha pregado a não-violência e a única arma que tenha levantado foi a do amor.
 
 
 No Brasil também temos a Polícia Militar (PM), uma instituição que tem o dever constitucional de impedir a violência, buscar a segurança e prevenir o crime, conforme artigo 144 da Constituição Federal, no entanto, ao lidar com situações de conflito a PM vem demonstrando que muitas vezes só consegue provocar mais violência, como aconteceu em Paraisópolis na madrugada deste último domingo. Fato bárbaro e abominável.
 
 
Um homem franzino e desarmado como Gandhi, sem nunca ter usado qualquer instrumento lesivo, conseguiu libertar um país, já a PM, com diferentes apetrechos lesivos, ainda assim, conta com violência nos conflitos que intervém, demonstrando que armas não resolvem e nem impedem o conflito, e nem sequer o intimidam, senão eles não ocorreriam, e que a PM foi mais preparada para se utilizar de armas do que do diálogo para resolução de conflitos.
 
 
Se a função institucional e constitucional da PM é impedir a violência, buscar a segurança e prevenir o crime, a PM cumpre com sua função quando age com violência ou quando resulta violência de suas ações? Não, não cumpre. E agindo assim a quem serve e para que serve a PM? A segurança de quem a PM está fazendo agindo assim?
 
 
Pode-se pensar; "mas a PM não age com violência, age no cumprimento do dever e dessa atuação pode resultar feridos". Não é cumprimento do dever quando alguém sai de uma ação policial ferido, ofendido ou morto. A PM não está autorizada a provocar esses resultados, isso não está dentro de seu dever institucional e constitucional. Quando esses resultados ocorrem é porque a PM agiu errado, miseravelmente errado, e descumpriu sua função.
 
 
Raquel Montero

quinta-feira, 14 de novembro de 2019

Artigo publicado pelo site Justificando

Abaixo, artigo que escrevi para o site www.raquelmontero.adv.br em 25.10 e que foi publicado pelo site Justificando na sua edição do dia 01.11. Justificando é um dos melhores canais de conteúdo jurídico do Brasil. No Justificando o artigo pode ser acessado através do link;





  Sexta-feira, 1 de novembro de 2019

Um pedido pelo aplicativo vale toda essa precarização?

Imagem: Reprodução

Por Raquel Montero

Quando Joaquim Nabuco disse num dos seus discursos da campanha abolicionista: “(…) nenhuma reforma política produzirá o efeito desejado enquanto não tivermos extinguido de todo a escravidão, isto é, a escravidão e a instituições auxiliares (…)”,  ele dirigiu sua fala aos nossos ancestrais, avós, bisavós, que o ouviam naquele momento histórico, no entanto, a mensagem de suas palavras, como disse Gilberto Freyre, chega a nós, até hoje, com a frescura e a mocidade de homem de hoje.

É o que se pode pensar quando nos deparamos na rua, sob o sol escaldante do meio dia, no trânsito “de pico” que tenta engolir quem ousa atrapalhar a pressa alucinada do motorista em chegar em seu destino, nas ruas de campo minado da cidade, um ciclista, no alto de sua bicicleta pedalando com uma mochila térmica nas costas estampada a marca do aplicativo que o chamou pelo celular para mais uma entrega. E lá vai ele, o ciclista-entregador fazer a entrega com sua própria bicicleta ou uma bicicleta alugada.

É durante o dia, sob o sol, mas também à noite, e na madrugada. Não tem horário, é a hora que a empresa de aplicativo chama, e ele tem que ir se quiser ganhar dinheiro. É um fato dos novos tempos, que nasceu do casamento dos cerca de 14 milhões de desempregados e desempregadas existentes atualmente no Brasil durante o atual governo de Bolsonaro com a precarização decorrente da reforma trabalhista e da retirada e alteração de outros direitos sociais. Filhos desse casamento, sinal dos novos tempos, esses tempos de neoliberalismo que pregam que direitos sociais e direitos trabalhistas são frescuras. Tempos em que, legítimo mesmo é indicar, como fez Bolsonaro, o próprio filho para ser embaixador, só porque ele fritou hambúrguer no outro país. Os outros? Ah, os outros! Que pedalem, ora! Meritocracia!

E quem são esses ciclistas entregadores, filhos do casamento do desemprego com a precarização do trabalho em tempos de neuroses e psicopatias institucionalizadas em esferas de governo? Uma pesquisa da  Associação Aliança Bike, criada em 2.003 com o objetivo de fortalecer a economia que gira em torno da bicicleta, traçou o perfil destes trabalhadores com base em centenas de entrevistas e assim levantou que eles são 99% são do sexo masculino, 71% se declararam negros, mais de 50% tem entre 18 e 22 anos de idade, a jornada de trabalho pode chegar a mais de 24 horas seguidas por um ganho médio mensal de menos de um salário mínimo, R$ 992,00 (seis reais a menos do que o salário mínimo, fixado em R$ 998,00). O menor valor mensal recebido encontrado no levantamento foi R$ 375,00, para entregadores que trabalham três horas diárias, e o maior foi R$ 1.460 reais, para 14 horas trabalhadas.


De acordo com a pesquisa, para 59% dos entrevistados a principal motivação para começar a fazer entregas por aplicativo foi o desemprego. Eles são também trabalhadores que não têm registro em suas Carteiras de Trabalho, porque não têm um contrato de trabalho com a empresa que fez a comida que foi pedida, nem com o aplicativo que o chama para fazer a entrega e nem com a pessoa que receberá a entrega. Portanto, são trabalhadores “autônomos”, se acontecer algo com eles na rua, durante a entrega, ninguém “tem nada a ver com isso”, e assim, exceto se contribuírem por conta própria, não vão poder acessar direitos na Previdência Social, tais como auxílio-doença, auxílio-acidente, e, até mesmo, aposentadoria. Mas como contribuir com a Previdência recebendo menos de um salário mínimo por mês por mais de 12 horas de trabalho em média?

Eles também são aqueles para os quais não é dispensada nenhuma estrutura para ficarem enquanto aguardam serem chamados para entrega, e por isso muitos podem ser vistos sentados em calçadas, e assim, também não há banheiros, ou seja, necessidades fisiológicas para essas pessoas se tornam um grande transtorno. Onde fazê-las? A alimentação desses trabalhadores também parece ser coisa de outro mundo nessa “uberização” do trabalho. Não há refeitório, por isso podemos vê-los comendo em calçadas.

Essas pessoas são aqueles que trabalham pedalando por mais de 12 horas por dia podendo levar o corpo a exaustão, e com isso desenvolver diversos problemas de saúde. São os que, com uma mochila térmica nas costas, sob o sol, sob a chuva, de madrugada, sem equipamentos de proteção, arriscam a vida no trânsito das ruas das cidades, que ainda não têm suas ciclovias e ciclofaixas. Essas pessoas são aquelas que tocam a campainha das casas para entregar a comida que foi pedida pelo aplicativo do celular. E que gosto tem essa comida para você?

Raquel Monteré Advogada, atua com Direito Nacional, Direito Internacional Público e Consultoria Jurídica

segunda-feira, 11 de novembro de 2019

ENTREVISTA PARA A REVIDE SOBRE O CONSTANTE CRESCIMENTO DE CASAMENTOS HOMOAFETIVOS

Revide, Casamentos homoafetivos cresceram 28% na região de Ribeirão Preto, casamento, homoafetivo, homossexual, ribeirão, preto, gay, lgbt, lésbica, união, estável, direitos, advogada, justiça,
De 2013 a 2018, casamentos homoafetivos registraram um aumento de 108% em todo o Estado de São Paulo
Casamentos homoafetivos cresceram 28% na região de Ribeirão Preto
Apesar do aumento, taxa de crescimento é menor do que ano anterior
   
Um casal homoafetivo, que se conheceu por meio de um aplicativo, e pretende realizar inseminação artificial e adotar filhos. A professora Fernanda Estela Bazo dos Santos Cano e a médica Mariana Vicente Cano, casadas desde maio deste ano, representam uma família cada vez mais comum no Brasil.
O casal faz parte de uma tendência percebida na região de Ribeirão Preto nos últimos seis anos. As uniões homoafetivas cresceram 28% no último ano na região. As informações foram retiradas do levantamento feito pelo Sistema Estadual de Análise de Dados, em 2018, e do Registro Civil de 2017 do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), divulgados no final de outubro.
Desde 2013, esse tipo de matrimônio teve uma alta 108% em todo o Estado de São Paulo. Apesar do aumento, a taxa de crescimento foi menor do que a de 2017, quando a região registrou um aumento de 74% nos casamentos entre pessoas do mesmo sexo.
Ademais, cerca de 77% de todos os casamentos homoafetivos na região foram realizados em Ribeirão Preto. O que representa um número expressivo, tendo em vista que o município concentra, aproximadamente, 40% de toda a população da Região Metropolitana (RMRP).
Já o número de casamentos heterossexuais vem caindo nos últimos anos na RMRP. Segundo dados do IBGE e da Fundação Seade, o número de matrimônios "tradicionais", caiu 17% entre 2016 e 2018.
Ainda segundo a pesquisa do Seade, em média, as mulheres em Ribeirão Preto casam com 32 anos e 6 meses. Enquanto os homens tendem a se casar aos 34 e 8 meses.
Mulheres se casam mais
Segundo o Seade, casamento entre mulheres é o que mais cresce na região. Em 2017, foram 46 casamentos entre mulheres e 36 entre homens. Já em 2018, o número foi de 31 casamentos entre homens e 74 entre mulheres.
Fernanda revela que nunca teve um relacionamento estável com outra mulher e, que ao longo da vida, sempre teve relacionamentos com homens.
"Eu, até então, tinha namorado somente homens, quando em 2017 senti que tinha algo 'errado' comigo. Fiquei com duas moças para 'testar'. Mariana foi minha terceira e a primeira que apresentei para a família", conta Fernanda.
Apesar do relacionamento ser bem aceito pela família, o casal conta que ainda tem receio de falar abertamente em determinados ambientes, principalmente, o de trabalho.
"Eu não falo pros alunos que eu sou casada com uma mulher. Eles sabem que eu sou casada, mas o nome do 'meu esposo' é um segredo", revela a professora. Apesar do preconceito, o casal espera ter três filhos. Um da barrigada de cada mãe e um terceiro adotado. 
Direitos adquiridos
Desde 2013, os cartórios brasileiros podem realizar casamentos entre pessoas do mesmo sexo. Em 14 de maio de 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com base em decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), publicou a Resolução 175, que passou a garantir aos casais homoafetivos o direito de se casarem no civil. Com a resolução, tabeliães e juízes ficaram proibidos de recusar o registro da união.
Com a conquista do direito de casar, os homossexuais passaram a usufruir de mecanismos legais que eram exclusividade de casais héteros. Pessoas do mesmo sexo começaram a ter todos os direitos e obrigações previstos em lei e firmadas em contrato, como a partilha de bens e herança de parte do patrimônio do parceiro em caso de morte.
Segundo a advogada Raquel Montero, a decisão tanto do STF, quanto do CNJ, foram respaldadas por anos de pesquisas cientificas e a desmistificação do assunto. Como a retirada da homossexualidade pela Organização Mundial da Saúde do Cadastro Internacional de Doenças (CID). E, também, a decisão da Associação Americana de Psiquiatria de não rotular mais a homossexualidade como desvio sexual.
"Em uma união estável, os casais homoafetivos passaram a ter os mesmos direitos que os heterossexuais. Foram 112 direitos reconhecidos a partir deste marco. Dentre os mais importantes, eu posso destacar o direito do companheiro pedir pensão alimentícia, direito da pensão do INSS em caso de morte, direito para adoção e o direito de ser incluído como dependente na declaração do imposto de renda", destaca a advogada.
Por fim, Raquel adverte que a legislação é essencial para garantir conquistas como essas, porém, a educação e o conhecimento seguem sendo os melhores remédios para a sociedade.
"O assunto que envolve discussões sobre o casamento homoafetivo e a temática LGBT+ são provenientes de ignorância e desconhecimento. A legislação também pode ser estimulada através de outros espaços, como universidades, escolas, ONGs, etc. Toda vez que promovemos instrumentos de reflexão, nós temos mais chances de levar esse conhecimento para a população. Porque o conhecimento é a melhor saída para acabarmos com estes preconceitos", conclui.
Foto: Deborah Evelyn