Raquel Montero

Raquel Montero

quinta-feira, 14 de novembro de 2019

Artigo publicado pelo site Justificando

Abaixo, artigo que escrevi para o site www.raquelmontero.adv.br em 25.10 e que foi publicado pelo site Justificando na sua edição do dia 01.11. Justificando é um dos melhores canais de conteúdo jurídico do Brasil. No Justificando o artigo pode ser acessado através do link;





  Sexta-feira, 1 de novembro de 2019

Um pedido pelo aplicativo vale toda essa precarização?

Imagem: Reprodução

Por Raquel Montero

Quando Joaquim Nabuco disse num dos seus discursos da campanha abolicionista: “(…) nenhuma reforma política produzirá o efeito desejado enquanto não tivermos extinguido de todo a escravidão, isto é, a escravidão e a instituições auxiliares (…)”,  ele dirigiu sua fala aos nossos ancestrais, avós, bisavós, que o ouviam naquele momento histórico, no entanto, a mensagem de suas palavras, como disse Gilberto Freyre, chega a nós, até hoje, com a frescura e a mocidade de homem de hoje.

É o que se pode pensar quando nos deparamos na rua, sob o sol escaldante do meio dia, no trânsito “de pico” que tenta engolir quem ousa atrapalhar a pressa alucinada do motorista em chegar em seu destino, nas ruas de campo minado da cidade, um ciclista, no alto de sua bicicleta pedalando com uma mochila térmica nas costas estampada a marca do aplicativo que o chamou pelo celular para mais uma entrega. E lá vai ele, o ciclista-entregador fazer a entrega com sua própria bicicleta ou uma bicicleta alugada.

É durante o dia, sob o sol, mas também à noite, e na madrugada. Não tem horário, é a hora que a empresa de aplicativo chama, e ele tem que ir se quiser ganhar dinheiro. É um fato dos novos tempos, que nasceu do casamento dos cerca de 14 milhões de desempregados e desempregadas existentes atualmente no Brasil durante o atual governo de Bolsonaro com a precarização decorrente da reforma trabalhista e da retirada e alteração de outros direitos sociais. Filhos desse casamento, sinal dos novos tempos, esses tempos de neoliberalismo que pregam que direitos sociais e direitos trabalhistas são frescuras. Tempos em que, legítimo mesmo é indicar, como fez Bolsonaro, o próprio filho para ser embaixador, só porque ele fritou hambúrguer no outro país. Os outros? Ah, os outros! Que pedalem, ora! Meritocracia!

E quem são esses ciclistas entregadores, filhos do casamento do desemprego com a precarização do trabalho em tempos de neuroses e psicopatias institucionalizadas em esferas de governo? Uma pesquisa da  Associação Aliança Bike, criada em 2.003 com o objetivo de fortalecer a economia que gira em torno da bicicleta, traçou o perfil destes trabalhadores com base em centenas de entrevistas e assim levantou que eles são 99% são do sexo masculino, 71% se declararam negros, mais de 50% tem entre 18 e 22 anos de idade, a jornada de trabalho pode chegar a mais de 24 horas seguidas por um ganho médio mensal de menos de um salário mínimo, R$ 992,00 (seis reais a menos do que o salário mínimo, fixado em R$ 998,00). O menor valor mensal recebido encontrado no levantamento foi R$ 375,00, para entregadores que trabalham três horas diárias, e o maior foi R$ 1.460 reais, para 14 horas trabalhadas.


De acordo com a pesquisa, para 59% dos entrevistados a principal motivação para começar a fazer entregas por aplicativo foi o desemprego. Eles são também trabalhadores que não têm registro em suas Carteiras de Trabalho, porque não têm um contrato de trabalho com a empresa que fez a comida que foi pedida, nem com o aplicativo que o chama para fazer a entrega e nem com a pessoa que receberá a entrega. Portanto, são trabalhadores “autônomos”, se acontecer algo com eles na rua, durante a entrega, ninguém “tem nada a ver com isso”, e assim, exceto se contribuírem por conta própria, não vão poder acessar direitos na Previdência Social, tais como auxílio-doença, auxílio-acidente, e, até mesmo, aposentadoria. Mas como contribuir com a Previdência recebendo menos de um salário mínimo por mês por mais de 12 horas de trabalho em média?

Eles também são aqueles para os quais não é dispensada nenhuma estrutura para ficarem enquanto aguardam serem chamados para entrega, e por isso muitos podem ser vistos sentados em calçadas, e assim, também não há banheiros, ou seja, necessidades fisiológicas para essas pessoas se tornam um grande transtorno. Onde fazê-las? A alimentação desses trabalhadores também parece ser coisa de outro mundo nessa “uberização” do trabalho. Não há refeitório, por isso podemos vê-los comendo em calçadas.

Essas pessoas são aqueles que trabalham pedalando por mais de 12 horas por dia podendo levar o corpo a exaustão, e com isso desenvolver diversos problemas de saúde. São os que, com uma mochila térmica nas costas, sob o sol, sob a chuva, de madrugada, sem equipamentos de proteção, arriscam a vida no trânsito das ruas das cidades, que ainda não têm suas ciclovias e ciclofaixas. Essas pessoas são aquelas que tocam a campainha das casas para entregar a comida que foi pedida pelo aplicativo do celular. E que gosto tem essa comida para você?

Raquel Monteré Advogada, atua com Direito Nacional, Direito Internacional Público e Consultoria Jurídica

segunda-feira, 11 de novembro de 2019

ENTREVISTA PARA A REVIDE SOBRE O CONSTANTE CRESCIMENTO DE CASAMENTOS HOMOAFETIVOS

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De 2013 a 2018, casamentos homoafetivos registraram um aumento de 108% em todo o Estado de São Paulo
Casamentos homoafetivos cresceram 28% na região de Ribeirão Preto
Apesar do aumento, taxa de crescimento é menor do que ano anterior
   
Um casal homoafetivo, que se conheceu por meio de um aplicativo, e pretende realizar inseminação artificial e adotar filhos. A professora Fernanda Estela Bazo dos Santos Cano e a médica Mariana Vicente Cano, casadas desde maio deste ano, representam uma família cada vez mais comum no Brasil.
O casal faz parte de uma tendência percebida na região de Ribeirão Preto nos últimos seis anos. As uniões homoafetivas cresceram 28% no último ano na região. As informações foram retiradas do levantamento feito pelo Sistema Estadual de Análise de Dados, em 2018, e do Registro Civil de 2017 do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), divulgados no final de outubro.
Desde 2013, esse tipo de matrimônio teve uma alta 108% em todo o Estado de São Paulo. Apesar do aumento, a taxa de crescimento foi menor do que a de 2017, quando a região registrou um aumento de 74% nos casamentos entre pessoas do mesmo sexo.
Ademais, cerca de 77% de todos os casamentos homoafetivos na região foram realizados em Ribeirão Preto. O que representa um número expressivo, tendo em vista que o município concentra, aproximadamente, 40% de toda a população da Região Metropolitana (RMRP).
Já o número de casamentos heterossexuais vem caindo nos últimos anos na RMRP. Segundo dados do IBGE e da Fundação Seade, o número de matrimônios "tradicionais", caiu 17% entre 2016 e 2018.
Ainda segundo a pesquisa do Seade, em média, as mulheres em Ribeirão Preto casam com 32 anos e 6 meses. Enquanto os homens tendem a se casar aos 34 e 8 meses.
Mulheres se casam mais
Segundo o Seade, casamento entre mulheres é o que mais cresce na região. Em 2017, foram 46 casamentos entre mulheres e 36 entre homens. Já em 2018, o número foi de 31 casamentos entre homens e 74 entre mulheres.
Fernanda revela que nunca teve um relacionamento estável com outra mulher e, que ao longo da vida, sempre teve relacionamentos com homens.
"Eu, até então, tinha namorado somente homens, quando em 2017 senti que tinha algo 'errado' comigo. Fiquei com duas moças para 'testar'. Mariana foi minha terceira e a primeira que apresentei para a família", conta Fernanda.
Apesar do relacionamento ser bem aceito pela família, o casal conta que ainda tem receio de falar abertamente em determinados ambientes, principalmente, o de trabalho.
"Eu não falo pros alunos que eu sou casada com uma mulher. Eles sabem que eu sou casada, mas o nome do 'meu esposo' é um segredo", revela a professora. Apesar do preconceito, o casal espera ter três filhos. Um da barrigada de cada mãe e um terceiro adotado. 
Direitos adquiridos
Desde 2013, os cartórios brasileiros podem realizar casamentos entre pessoas do mesmo sexo. Em 14 de maio de 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com base em decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), publicou a Resolução 175, que passou a garantir aos casais homoafetivos o direito de se casarem no civil. Com a resolução, tabeliães e juízes ficaram proibidos de recusar o registro da união.
Com a conquista do direito de casar, os homossexuais passaram a usufruir de mecanismos legais que eram exclusividade de casais héteros. Pessoas do mesmo sexo começaram a ter todos os direitos e obrigações previstos em lei e firmadas em contrato, como a partilha de bens e herança de parte do patrimônio do parceiro em caso de morte.
Segundo a advogada Raquel Montero, a decisão tanto do STF, quanto do CNJ, foram respaldadas por anos de pesquisas cientificas e a desmistificação do assunto. Como a retirada da homossexualidade pela Organização Mundial da Saúde do Cadastro Internacional de Doenças (CID). E, também, a decisão da Associação Americana de Psiquiatria de não rotular mais a homossexualidade como desvio sexual.
"Em uma união estável, os casais homoafetivos passaram a ter os mesmos direitos que os heterossexuais. Foram 112 direitos reconhecidos a partir deste marco. Dentre os mais importantes, eu posso destacar o direito do companheiro pedir pensão alimentícia, direito da pensão do INSS em caso de morte, direito para adoção e o direito de ser incluído como dependente na declaração do imposto de renda", destaca a advogada.
Por fim, Raquel adverte que a legislação é essencial para garantir conquistas como essas, porém, a educação e o conhecimento seguem sendo os melhores remédios para a sociedade.
"O assunto que envolve discussões sobre o casamento homoafetivo e a temática LGBT+ são provenientes de ignorância e desconhecimento. A legislação também pode ser estimulada através de outros espaços, como universidades, escolas, ONGs, etc. Toda vez que promovemos instrumentos de reflexão, nós temos mais chances de levar esse conhecimento para a população. Porque o conhecimento é a melhor saída para acabarmos com estes preconceitos", conclui.
Foto: Deborah Evelyn