Raquel Montero

Raquel Montero

sexta-feira, 27 de março de 2015

No Jardim Canadá, o ridículo do individualismo

Foto: Taiga Cazarine/G1)


Escreveu Karl Marx e Friederich Engels que o livre desenvolvimento de cada um é a condição para o livre desenvolvimento de todos.

Essa é a máxima do verdadeiro cristão também, que segue Jesus, o Messias enviado pelo Pai para dar lições de amor à humanidade.  Em uma dessas lições, Jesus chama à mesa e reparte o pão com seus iguais.

A práxis, no entanto, as vezes esbarra em interesses que fazem rasgar a teoria fazendo ela restar como demagogia.

A convivência nos mostra que, ela mesma, convivência, não é fácil. A vida em sociedade nos traz muitos desafios a transpor. Ao mesmo tempo, a falta da convivência não nos propicia a evolução, porque é na própria convivência que encontramos as lições necessárias para a também necessária evolução.

Nos extremos sempre existe um ponto, que separa um e outro. Este é o almejado equilíbrio, que não se constrói com exclusão, nem sem a inclusão. Eis o ensinamento com a divisão do pão, de Jesus, e a condição para o livre desenvolvimento de todos, de Marx e Engels.

Nos moldes das propostas deixados pelas três pessoas aqui citadas, para ficarmos em apenas três exemplos dos muitos deixados pela história com a mesma mensagem, o que faz uma pessoa pensar que a violência que teme será extirpada com sua própria segregação do resto da sociedade através de muros, grades, cercas, etc? A violência do lado de fora do muro deixará de existir, simplesmente com a presença do muro?

O problema da violência se resolve com muros, guaritas, cercas e outros apetrechos produzidos pela indústria que lucra com a própria violência?

Será a violência um problema social onde todos têm o dever de contribuir para cessar ou será a violência um problema criado pelo próprio infrator que comete o crime e todas as demais pessoas da sociedade estão isentas de qualquer participação no fruto da sociedade?

Esticando um pouco mais o individualismo contido nesse pensamento, o que faz aquele que não pode blindar seu carro e sua casa, dentro da mesma sociedade daquele que pode blindar?

Essas reflexões me vieram na cabeça assistindo ao episódio recente promovido pelos moradores do Jardim Canadá, bairro da zona sul de Ribeirão Preto, que aprovaram parte do fechamento do bairro, com muros e guaritas, para transformá-lo em um condomínio, sob o fundamento de que estão agindo por medo da violência.

Como se não bastasse o pensamento individualista da segregação, o fato praticado pela Associação de Moradores do Jardim Canadá, aprovado por cerca de 80% dos moradores do bairro, ainda carrega vício de inconstitucionalidade já que estão promovendo a construção de muros e guaritas em cerca de 12 ruas e 21 quarteirões do bairro, baseados em uma lei municipal (Lei Complementar Municipal nº 2462 de 2011), sendo que a competência para legislar sobre condomínios é da União, e não do Município. O Ministério Público já ajuizou ação civil pública para pleitear a demolição dos muros e das guaritas, sob o fundamento da inconstitucionalidade da lei municipal aludida.

A Associação de Moradores do Jardim Canadá, procurada pela imprensa, em nenhum momento quis se manifestar para defender seus atos.

Finalizo este artigo com uma parte da letra da música do Rappa, que sempre me lembro quando vejo os condomínios já construídos e os que estão sendo construídos pelas cidades; "as grades do condomínio são pra trazer proteção, mas também trazem a dúvida se é você que tá nessa prisão..."

Essa é a paz que eu não quero conservar pra tentar ser feliz. Repartir o pão é fazer com que todos se alimentem, e com todos alimentados não haverá esfomeados. É na falta de oportunidades que jaz a maior causa da criminalidade. É contra isso que temos que lutar, é contra isso que temos que nos unir. Muros separam, pontes unem.


Raquel Montero

Artigo publicado também no jornal Tribuna de Ribeirão, em 27 de março de 2015; http://www.tribunaribeirao.com.br/aplicativo/no-jardim-canada-o-ridiculo-do-individualismo/

quinta-feira, 19 de março de 2015

Pacote anticorrupção e a decisão de cada um




Em cerimônia nesta quarta-feira (18), a Presidenta Dilma lançou o que ficou denominado de "Pacote Anticorrupção". “A guerra contra a corrupção deve ser, simultaneamente, uma tarefa de todas as instituições, uma ação permanente do governo e também um momento de reflexão da sociedade de afirmação de valores éticos”, afirmou Dilma durante a solenidade.

São sete medidas ao todo, sendo que cinco delas dependem de aprovação do Congresso.

A primeira é a assinatura de um acordo de cooperação entre diversas entidades, como o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a Controladoria-Geral da União (CGU), a OAB e o Conselho Nacional do Ministério Público para a avaliação de propostas para agilizar processos judiciais, procedimentos administrativos e demais procedimentos relacionados à prática de ilícitos contra o patrimônio público. A segunda é a publicação do decreto que regulamenta a Lei Anticorrupção. O texto incentiva as empresas privadas a adotarem códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes para detectar desvios e irregularidades contra a administração pública, além de disciplinar o acordo de leniência com empresas culpadas de corrupção e estabelecer multas e outras punições às companhias condenadas.

Todas as outras cinco medidas dependem do Congresso. No pacote, o governo pede urgência para a votação do projeto de lei nº 2.902/2011, que prevê a alienação antecipada de bens sobre os quais haja provas ou indícios suficientes de ser produto ou proveito de crime, e a votação do projeto de lei nº 5.586/2005, que tipifica o enriquecimento ilícito e prevê penas de 3 a 8 anos para quem possuir, adquirir ou fizer uso de bens incompatíveis com renda ou evolução patrimonial.

Além disso, o governo enviará três projetos de lei ao Congresso, um pedindo Ficha Limpa para Servidores dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário; outro viabiliza o confisco dos bens que sejam fruto ou proveito de atividade criminosa, improbidade e enriquecimento ilícito; e um terceiro com a criminalização do Caixa 2 no âmbito da lei eleitoral, com pena de três a seis anos ou de três a dez anos conforme o tipo de utilização desse recurso.

Em seu discurso, Dilma tentou se mostrar aberta às reivindicações dos manifestantes de 15 de março, levados às ruas, em grande parte, pela bandeira anticorrupção. Dilma afirmou que seu governo tem um "compromisso" e "obrigação" de combater a impunidade, encarada por ela como "o maior fator que garante a reprodução da corrupção".

 "Todos os brasileiros de bem, de boa fé, mesmo aqueles que não votaram em mim, sabem que a corrupção no Brasil não foi inventada recentemente", afirmou. "O Brasil de hoje combate a corrupção. As notícias sobre casos aumentam porque eles não são mais varridos para baixo do tapete", disse.

É fato que num país regido por leis expressas, o seu arcabouço jurídico e legal deve contemplar medidas como essas. Há os que podem dizer agora; "veio tarde". Mas enfim, até o presente momento, após todos os demais presidentes que nos antecederam, elas nunca existiram. Foi a Presidenta Dilma que as concretizou. Ponto para ela.

É fato, também, como disse a Presidente, e razão assiste a ela, que corrupção existe por conluio de pessoas, no mínimo duas. Existe em vários setores, e não só no público, como faz prova as denúncias contra igrejas, padres, empresas privadas, famílias, etc. Portanto, o fim da corrupção ou sua inexistência, depende da decisão de cada um que é testado em diferentes momentos da vida.

Nesse sentido, cito, a título de exemplo, uma situação recente ocorrida na Câmara de Ribeirão Preto para mostrar o contraste de condutas (de um lado o da Presidenta Dilma, e de outro, o dos vereadores). Em 10 de dezembro de 2013, 20 dos 22 vereadores de Ribeirão Preto aprovaram as contas da Prefeita Dárcy Vera que foram rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE).

Eu discordo absolutamente dessa aprovação. As contas tinham que ter sido reprovadas pelos vereadores, pois os fundamentos usados pelo TCE para a reprovação das contas revelam flagrantes de graves irregularidades que inclusive levam a inelegibilidade da Prefeita por oito anos.

Na época, dezembro de 2013, listei os principais motivos pelos quais defendi a reprovação das contas apresentadas pela Prefeita, sendo estes;

- nos últimos 4 anos a Prefeitura registrou déficit orçamentário seguido. O déficit orçamentário atual é de 8,52%;
- há incompatibilidades entre programas e ações previstas no Plano Plurianual, na Lei de Diretrizes Orçamentárias e na Lei Orçamentária Anual;
- houve aumento de terceirização de servidores por intermédio de contratos com a Companhia de Desenvolvimento Econômico de Ribeirão Preto (CODERP);
- não houve recolhimento de precatórios;
- despesas com publicações não licitadas;
- em contrato da Prefeitura com a CODERP a Administração passou a pagar preços muito superiores aos que vinha praticando, configurando preços superiores ao de mercado. Tal prática se deu sem cobertura contratual durante 3 meses;
- Município ainda não tem Plano Municipal de Saneamento Básico;
- alto número de comissionados que extrapolou o limite legal.

São motivos graves e suficientes para reprovação das contas e, por conseguinte, para a inelegibilidade da Prefeita. Porém, os vereadores aprovaram as contas e seguimos com essas irregularidades.  Nenhum dos vereadores que votaram pela aprovação subiu na tribuna para justificar o voto.

Dos 22 vereadores, tão somente dois não votaram pela aprovação; Gláucia Berenice (PSDB) e Cícero Gomes (PMDB). Cícero não votou porque, na época, era o Presidente da Câmara e não precisava votar, e a oposicionista por ter deixado o plenário momentos antes.

É a decisão de cada um que faz a situação mudar ou não.


Raquel Montero

terça-feira, 10 de março de 2015

Uma coisa, é uma coisa. Outra coisa, é outra coisa.



Sim, os direitos trabalhistas devem ser mantidos. Não, as fraudes não podem continuar. Sim, as grandes fortunas devem ser tributadas. Não, o dinheiro público não pode ser gasto sem rigor e seriedade.

Uma coisa, é uma coisa, outra coisa, é outra coisa. As alterações feitas nas concessões de benefícios trabalhistas e previdenciários não têm o escopo de diminuir direitos trabalhistas, mas sim, de otimizar o dinheiro público garantindo o equilíbrio fiscal do governo nos próximos anos e a atração de investimentos para a retomada do crescimento econômico, sem que, com isso, haja prejuízos para o trabalhador.

As alterações realizadas em direitos trabalhistas e previdenciários, quais sejam, Abono Salarial, Seguro-Desemprego, Pensão por Morte, Auxílio Doença e o chamado Seguro-Defeso, pago a pescadores profissionais, não os diminuem, nem os enfraquece, faz as adaptações necessárias à nova realidade do mercado de trabalho brasileiro, permitindo a manutenção dos direitos dos trabalhadores e de políticas sociais, corrigirão distorções na concessão de benefícios trabalhistas e previdenciários, detectados em auditorias realizadas pelo Governo.

Nesse sentido, as alterações não vêm também para atacar fraudes. Não se justificam por isso, porque já declarou o Governo que fraudes devem ser resolvidas com mais fiscalização.

A sustentabilidade da Previdência e dos programas sociais dependem dessas correções, do rigor e da seriedade com o dinheiro público. Se não agirmos de forma sustentável agora, são as próximas gerações que vão arcar com um preço muito alto. Precisamos olhar para o futuro  de forma sustentável.

De acordo com dados do Ministério da Fazenda, as alterações garantirão economia de R$ 18 bilhões por ano ao Governo Federal, cerca de 0,3% do PIB previsto para o próximo ano. As mudanças não atingem os atuais beneficiários e serão válidas apenas daqui para frente.

As novas medidas possibilitarão dar continuidade à política de valorização do salário mínimo, alinhar o Brasil com padrões internacionais, eliminar excessos e corrigir distorções. Por exemplo, veja as distorções;

- sobre o abono salarial; quando ele foi criado, em 1990, o valor real do salário mínimo era muito baixo e não existia o Bolsa-Família;

- sobre a pensão por morte; estudo do Ministério da Previdência Social com 132 países apontou que 78% dos países possuem alguma regra de carência para o benefício (o Brasil não tem nenhuma carência); 77% dos países estabelecem requisitos para condicionar a concessão do benefício para cônjuges e companheiros, sendo, exigência de idade mínima (exigida em 41% dos países), tempo mínimo de casamento ou união estável (31% dos países), cessação do novo benefício com novo casamento (55% dos países).

Fazendo um cálculo, de 2006 até 2013, o gasto do Brasil com pagamento de pensão por morte só subiu, exponencialmente. Em 2006 o gasto foi de 39 bilhões, em 2013 quase 87 bilhões. Em uma comparação internacional com 15 países, o Brasil é o que mais gasta com pagamento de pensão por morte. São 3,2% do PIB brasileiro para essa destinação, enquanto que para outros países a percentagem é bem menor (Bélgica, 2,8%, Itália 2,6%, Portugal 1,6%, França 1,5%, Japão 1,2%, Suiça 1,2%, Chile 1,1%, Irlanda 0,8%, Suécia 0,7%, Espanha 0,6%, Reino Unido 0,6%).

Contudo, essas alterações não excluem outras medidas, assim como outras medidas não excluem a necessidade dessas alterações, elas se complementam. Nesse espírito seria conciliador com a intenção de otimizar o dinheiro público e aumentar o PIB, a criação do imposto sobre grandes fortunas, único imposto federal ainda não criado pelo Brasil. E sua criação renderia em favor do erário brasileiro cerca de 100 bilhões por ano. Isso seria uma grande iniciativa a esquerda, somando-se, literalmente, com "nobreza" às medidas aludidas.

O Brasil tem grande distorção tributária. Ele taxa em excesso o consumo e subtributa o patrimônio e a renda. Os preços de diversos bens no Brasil ficam majorados em torno de 50% em razão da tributação do consumo. Quando se tem uma tributação equilibrada, como nos países desenvolvidos, a tributação sobre o consumo não excede a 30%, e o imposto sobre grandes fortunas permite aliviar uma parte dessa tributação do consumo sem sacrificar a arrecadação pública. São medidas pró-crescimento com justiça social e equilíbrio fiscal.

Veja um exemplo; tributando patrimônios de cerca de um milhão de reais já se retira da tributação 95% ou 98% da população brasileira. E, ao estabelecer essa tributação, uma alíquota mínima de 1%, por exemplo, já rende 100 bilhões de reais por ano para o erário brasileiro, incidindo em apenas 5 ou 2% da população brasileira, o que faz com que o consumo de bens elementares à sobrevivência sejam menos tributados, ou melhor, não sejam tributados, provocando, assim, a diminuição no custo de vida.


Raquel Montero

sábado, 7 de março de 2015

08 de março




A nós mulheres muitas discriminações foram fixadas, e a história não nos deixa mentir. E muito de nossa emancipação foi provocada pelas próprias mulheres que sofreram as angústias do preconceito. Mulheres que mostraram que a capacidade não tem sexo, provém do esforço que cada pessoa, homem ou mulher, pode desenvolver.
Foram e são, mulheres nos mais variados trabalhos, deixando explícita a mensagem de como é estratégico e fundamental as cidades, os estados, e os países como um todo, terem mulheres desempenhando funções.
Temos omissões e ações discriminatórias que fazem com que desde os primórdios até hoje, sejamos consideradas menos em grau de importância nos diferentes trabalhos, e, notadamente, em cargos de direção. E com isso nossa participação nesses cargos ainda é muito pequena e muito menor que de homens, muito embora sejamos mais no total da população brasileira. A realidade comprova isso, inclusive, os mandatos eletivos; há apenas dois anos a primeira mulher ocupou espaço na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados; as mulheres são minoria exorbitante na Câmara dos Deputados, no Senado, nas Assembleias Legislativas, nas Câmaras Municipais. Dilma é a primeira Presidenta da República, a Prefeita Dárcy Vera é a primeira Prefeita de Ribeirão Preto. E a diferença não existe só na eleição, já na candidatura o número de mulheres é bem menor que o número de homens que se candidatam. Na foto acima eu estava em um debate realizado com candidatos a deputada(o) estadual, na última eleição. Eu sou a única mulher. Flagrante a desproporção.

Todavia, quando a disputa ou escolha para um cargo se dá, realmente, por critério de melhor técnica ou conhecimento, as mulheres, lideram a ocupação nos cargos de trabalho, exemplo enfático disso ocorre nos concursos públicos.

Em casa, no trabalho, nos relacionamentos, temos que ocupar o espaço que é da mulher, nem melhor, nem pior que o do homem, um espaço igual. A igualdade de fato também trará o respeito que está faltando nas relações, e assim não veremos mais a violência praticada contra a mulher. A cada 05 minutos uma mulher é espancada no Brasil. Em 70% dos casos o marido ou namorado que bateu ou matou. Quase 70% das mulheres que procuram atendimento na rede pública de saúde para curar ferimentos foram agredidas dentro de casa. Toda essa violência também é resultado da discriminação.

Somos todos partícipes da mesma sociedade, e, desse modo, todos nós colheremos os frutos produzidos socialmente, sejam eles doces ou amargos. A agressão ou discriminação à uma mulher não é só a agressão ou discriminação à uma mulher, é a agressão à todo o gênero feminino, aos filhos e às gerações futuras que geradas com violência ou discriminação terão grande probabilidade de também reproduzirem violência ou discriminação.

As discriminações que já vi, me deixaram, num primeiro momento, catatônica, após, me deixaram refletindo, depois, a reflexão me trouxe a indignação e com ela o ideal de fazer uma outra história. Uma história em que, mulher e homem, tenham sempre as mesmas chances de serem protagonistas.




Raquel Montero