Raquel Montero

Raquel Montero

terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

JUDICIÁRIO E A SEPARAÇÃO DO CASAL

Foto: Reprodução


Esse texto é sobre Direito e separação de casal. Esses dias foi proferida a sentença em uma ação judicial feita por um homem para pleitear alimentos, popularmente chamada de "pensão alimentícia", à mulher, ex-companheira. Eu sou advogada da mulher.
 
Viveram juntos por quase duas décadas. Não tiveram filhos. A ação não tinha a menor viabilidade, estava fadada ao insucesso. E assim aconteceu. Quando liguei para minha cliente, a mulher, senti o peso que lhe foi tirado das costas.Apesar de dizer a ela que essa ação não tinha a menor viabilidade, numa situação dessas, só a sentença traz efetiva paz à pessoa.
 
Mas enfim, o que quero dizer sobre essa ação é que, uma vez que não havia, de novo, repito, a menor possibilidade da ação ser julgada procedente, não tinha, então, fundamentos para fazê-la, promovê-la, tanto é que a parte que perdeu a ação nem recorreu as outras instâncias judiciárias, e haviam mais duas instâncias para recorrer.
 
Na prática, então, o que significou essa ação? Significou a manifestação do ressentimento que ficou da separação, dos sentimentos mal resolvidos que entraram pelo caminho do Judiciário, numa tentativa de resolver sentimentos no Judiciário.
 
Há diversas ações que trilham todos os dias o mesmo caminho. Caminho errado.
 
Em que pese o Judiciário estar buscando cada vez mais resolver os conflitos mediante a atuação de conciliadores e mediadores, o processo judicial nunca será o caminho certo para tratar ressentimentos e mágoas.
 
E não será, não porque o Judiciário, ainda ( ! ), não tem a estrutura para proporcionar trabalhos de mediação e conciliação à todos os litigantes, bem como não porque o Judiciário não faz os investimentos necessários para ofertar com a qualidade exigida para tanto em trabalhos de mediação e conciliação, mas porque mágoas e ressentimentos não são tratados em um processo judicial e pelo Judiciário. Lá não é lugar para isso e nunca vai ser.
 
E pegar o caminho errado, nesse caso, ainda ocasiona atrasar o julgamento de conflitos daqueles que pegaram o caminho certo, exatamente como num congestionamento de carros.
 
Raquel Montero

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

Denúncia no Ministério do Trabalho




Na Avenida Costábile Romano, esquina com a rotatória da Unaerp, em Ribeirão Preto, tem um posto de combustível Petrobrás-BR, onde eu abastecia o carro. Abastecia. Não abasteço mais.

Não abasteço mais desde que vi como os funcionários do posto têm que fazer a lavagem de carros nesse posto. Eles fazem isso num local sem proteção contra exposição ao sol e chuva. O que foi feito pelo posto para tentar inibir a exposição ao sol e a chuva foi uma pseudo cobertura no estilo tenda, que tem só um tecido por cima e as laterais são todas abertas, e, ainda assim, o tecido da tenda não cobre toda a parte de cima do local, que contém aberturas.

Quando vi isso, vi também o funcionário que estava fazendo a lavagem ter que parar a lavagem porque começou a chover, e como a chuva demorou em passar, o funcionário, constrangido em deixar o cliente ficar esperando, terminou a lavagem durante a chuva mesmo. Quando acabou a lavagem o funcionário estava com o uniforme molhado.

Perguntei ao funcionário se ele tinha outra roupa ou uniforme para colocar em substituição ao que ficou molhado. Ele disse que não, ou seja, o funcionário ia continuar trabalhando com o uniforme molhado até ir embora. Nessa mesma oportunidade vi que o braço desse mesmo funcionário estava queimado de sol, e com marcas que se encaixavam direitinho onde terminava o uniforme dele no corpo, e foi quando perguntei também se o posto fornecia protetor solar e óculos solar.

Solicitei conversar com o gerente do posto que estivesse trabalhando naquele momento. Fui apresentada para o gerente de nome Luciano. Relatei essas circunstâncias para ele e minha indignação e lamento pelas condições deficientes de trabalho que um posto de combustível proporciona a seus trabalhadores. Expressei como essa situação é ofensiva à saúde dos trabalhadores e tão desnecessária, tendo em vista que com investimentos ínfimos ela poderia ser tão melhor, além de tal imagem depreciar o posto ao dar margem ao pensamento de que o posto parece não valorizar os trabalhadores que tem ao não proporcionar as melhores condições possíveis a seus trabalhadores.

E quando falei de "melhores condições possíveis de trabalho a seus trabalhadores" tentei fazê-lo refletir o quão feio se apresenta um posto de combustível que não acha possível proporcionar a seus trabalhadores um local coberto, sem exposição a sol e chuva, para lavagem de carros.

Por fim, disse ao gerente Luciano que eu voltaria a passar pelo posto para ver se algo mudou nesse sentido, e que se em um mês eu não visse mudança eu faria uma reclamação no Ministério do Trabalho.

O tempo passou, mais três meses vieram e nada mudou naquele situação. Assim sendo, fiz o registro ontem no Ministério do Trabalho, e, ato contínuo, voltei ao posto para mostrar ao gerente o protocolo do registro e para dizer que naquele posto eu não consumo mais, porque não concordo com condições de trabalho que o posto proporciona a quem trabalha para ele.

Raquel Montero


Só depoimento de policiais?

Foto: Reprodução


Um policial vale mais que um cidadão? Para algumas pessoas, notadamente, membros do Judiciário e Ministério Público, sim.
 
 
Eu já fiz essa pergunta em outro texto que escrevi.
 
 
De forma geral, tomando como base os processos criminais no Brasil, a resposta para essa pergunta continua a mesma, infelizmente.
 
 
Os depoimentos de policiais são prestigiados pela doutrina jurídica e jurisprudência brasileira. É comum em processos penais iniciados por flagrantes, que os policiais que realizaram a prisão do acusado sejam as principais testemunhas, quando não as únicas, do crime, bem como que sejam considerados como provas do crime, e muitas vezes, como única prova do crime.
 
 
Tal comportamento, está em desacordo com o que determina a lei brasileira que disciplina a situação. No caso, a lei que disciplina a situação é o Código de Processo Penal, e ele preconiza que a acusação de prática de crime contra alguém deve trazer junto a prova da acusação, e o testemunho do policial que realizou a diligência relativa ao suposto crime que ele alega que existiu, não é prova, é só a alegação do policial, e essa alegação deve ser provada.
 
 
O policial que faz a acusação de um crime contra alguém não pode, ao mesmo tempo, ser tido também como testemunha do crime que ele alega que foi praticado, isso seria como querer também que a vítima fosse também testemunha do crime que ela alega que foi praticado contra ela.
 
 
A divergência ou exceção ocorre quando verificamos juízes/juízas entenderem e decidirem de maneira contrária. Eis a exceção com que nos deparamos, e que me leva a escrever esse outro texto sobre o mesmo assunto.
 
 
Recentemente, em Serrana, um cliente recebeu uma sentença de absolvição da juíza Isabela de Souza Nunes Fiel, em razão da juíza verificar insuficiência de provas para a acusação, em razão, exatamente, da acusação do Ministério Público restringir-se aos depoimentos dos investigadores da Polícia Civil, que não conseguiram provar suficientemente pontos cruciais contestados pela defesa. E, dessa forma, a juíza absolveu o réu por insuficiência de provas, que, concomitantemente, leva a permanência da presunção de inocência do acusado.
 
 
 
Transcrevo aqui partes da sentença referentes a esse ponto;
 
 
 
Analisando atentamente o conjunto probatório acostado aos autos, observo a insuficiência das provas acostadas, tanto para a acusação quanto para a defesa. E, sendo assim,melhor para esta, dada a presunção de inocência da qual todos gozamos. Com efeito, a prova da acusação restringe-se aos depoimentos dos investigadores da Polícia Civil que cuidaram do caso. Entretanto, ainda que pesem em seu favor as prerrogativas próprias de funcionários públicos, há pontos cruciais contestados pela defesa que não foram suficientemente comprovados.
 
 
Ademais, os investigadores relataram que os objetos utilizados no assalto foram encontrados na casa dos acusados. No entanto, consta nos auto apenas um mandado de busca e apreensão, expedido para a casa de xxxxx (fls. 18/19). Assim, põe-se em dúvida a própria validade das provas colhidas.
 
 
 
 
A simples condição de policial não traz garantia de honestidade ou infalibilidade ao policial. Ou sobre algum ser humano recai a certeza de ser uma pessoa infalível e honesta? Se antes de ser policial, o policial é um ser humano, alguém pode, realmente, julgá-lo um ser humano infalível e sempre honesto? Alguém pode dizer isso de algum ser humano?
 
 
Apesar dos policiais serem funcionários públicos e praticarem atos em nome do Estado, dar fé à palavra do policial, condenando uma pessoa apenas com base em seu testemunho, é prestigiar um ser humano em detrimento do outro, é valorizar mais o policial e menos o cidadão.
 
 
Ao aceitar o depoimento do policial sem fazer qualquer questionamento, o Poder Judiciário demonstra que as pessoas que atuam na administração pública devem receber maior credibilidade do que os demais cidadãos, sem demonstrar, porém, os motivos que levam tais pessoas a serem merecedoras de maior confiabilidade. Afirma-se que pelo simples fato de atuarem em nome do Estado possuem idoneidade e caráter que as diferenciam das “pessoas comuns”.
 
 
Por tais razões as teses de defesa continuam abrangendo a parcialidade ou impedimento dos policiais, civis e militares, que participaram de alguma forma da prisão ou investigação contra o acusado.
 
 
E em tempos de "sentença por convicção" ao estilo Moro ou Rosa Weber, a sentença ainda rememora lições básicas da doutrina penal;
 
 
 
 Diante deste cenário, entendo que o grau de certeza necessário a um juízo condenatório não foi atingido, ônus que incumbia ao Ministério Público. E, em havendo dúvida quanto à prática do crime e participação dos denunciados, deve-se preferir a absolvição, até mesmo porque: “O Direito Penal não opera com conjecturas ou probabilidades. Sem certeza total e plena da autoria e da culpabilidade, não pode o Juiz criminal proferir condenação” (Ac. Un. Da5ª Cam. De 19.7.77, na Ap. n. 162.055, de Jaú, rel. GOULART SOBRINHO, ref. por Azevedo Franceschini, in: Jurisprudência Penal e Processual, vol. 8, p.313).
 
 
 
Há esperança.
 
 
Raquel Montero