Raquel Montero

Raquel Montero

quarta-feira, 23 de dezembro de 2020

O que a vida quer da gente é coragem

Artigo também publicado pelo Jornal Tribuna em sua edição do dia 06.01.2021. No Jornal Tribuna o artigo também pode ser acessado na internet através do link:

https://www.tribunaribeirao.com.br/site/o-que-a-vida-quer-da-gente-e-coragem/




Foto: Reprodução

 


Acima de tudo 2020 foi um ano de pandemia que levou muitas pessoas e que deixou diferentes reflexões.

 

A necessária medida de isolamento social, recomendada pelas autoridades médicas e sanitárias, dentre elas, a Organização Mundial de Saúde (OMS), como medida mais eficaz no combate ao vírus, trouxeram junto, apesar dos pesares, uma fértil oportunidade de nos voltarmos para dentro, já que não podíamos ir para fora - e a recomendação é que continuemos não indo - e com isso refletirmos mais sobre a vida e todos os aspectos sociais que a preenchem e que nos faz coexistir em sociedade, como uma grande fraternidade universal que, se não somos ainda, é o que deveríamos ser e buscar ser.

 

São os conflitos entre as pessoas que fazem com que direitos humanos e sociais tenham que ser reivindicados, do contrário, se não existissem conflitos, não teria reivindicação. E essa situação é uma grande demonstração, portanto, do muito que ainda temos que evoluir.

 

Essa evolução é absolutamente possível, e todas as pessoas têm a capacidade de ser mais e melhor. E quando nasce um ano novo é comum que se pense em mudanças, em tudo aquilo que não se quer mais e tudo aquilo que se quer conquistar. A evolução e a mudança são possíveis desde que se tome decisão para isso, e se misture a ela quatro outros ingredientes ou valores: amor, luta, esperança e conhecimento.

 

Só o amor constrói, e constrói quando lutamos. Milagres acontecem quando vamos a luta. E o que nos alimenta na luta é a esperança e o conhecimento, que não só liberta, como, também, nos emancipa da ignorância que tanto mal produz.

 

É possível as mudanças que queremos ver acontecer porque temos a força motriz que tudo move nas engrenagens da vida. Não é por outra razão que, segundo o Cristianismo, o Pai teria dito: "sóis deuses". E como deuses ele teria explicado que cada pessoa é capaz de fazer tudo aquilo que pede ao próprio Pai. As pessoas, então, carregariam dentro de si, em sua centelha divina, a força e a capacidade de realizar mudanças, em suas própria vidas e na sociedade. No mesmo sentido o filósofo, escritor e educador indiano Krishnamurti afirmava que o autoconhecimento era a chave para solucionar os problemas humanos, e a urgente mudança social só seria possível a partir de uma transformação individual (Krishnamurti, o Livro da Vida, São Paulo, 3º Ed. Academia, 2.016).

 

Na trilha da evolução é imprescindível também que cada pessoa seja responsável por seus atos e pensamentos e o que eles geram em sua vidas, nas vidas das outras pessoas e na vida como um todo, no mesmo espírito que pregou Gandhi incansavelmente; "que cada pessoa seja a mudança que quer ver no mundo". Tomar decisões sem se responsabilizar pelos próprios atos e as consequências deles é o mesmo que dizer "eu quero e sou capaz, mas não tenho coragem de assumir riscos e dificuldades, e, muitas vezes, erros." Como se avança sem correr riscos?

 

E ai, então, para viver se verifica a necessidade de mais um ingrediente ou valor a se somar aos outros; a coragem. Para viver é preciso ter também "coragem", que, por sua vez, decorre e é alimentada pela esperança, porque "o contrário do medo não é a coragem, é a fé", como bem explicou Frei Betto, e da fé vem a coragem para agir. E no mesmo sentido, em versos que acaloram e estimulam a alma, Guimarães Rosa teria eternizado esse mandamento da vida: "A vida é assim; esquenta e esfria, aperta e dai afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem."

 

O que a vida quer da gente é coragem, hoje e sempre. Coragem para decisões, para agir, para viver e, sobretudo, para amar. Feliz 2021!

 

Raquel Montero

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

A difícil e corajosa atitude de denunciar o assediador





Artigo também publicado pelo Jornal Tribuna em sua edição do dia 09.12.2020. No Jornal Tribuna o artigo também pode ser acessado na internet através do link:

https://www.tribunaribeirao.com.br/site/a-dificil-e-corajosa-atitude-de-denunciar-o-assediador/






Na última sexta-feira, dia 04, a atriz e humorista Dani Calabresa publicou um texto em suas redes sociais denunciando os assédios sexuais que sofreu de Marcius Melhem, ator, roteirista, diretor e coordenador do departamento de humor da emissora Globo.

 

Os detalhes dos assédios foram publicados pela Revista Piauí, para quem Calabresa deu depoimento. Para a reportagem, que pode ser utilizada como denúncia em processos judiciais, foram ouvidas 43 pessoas em conversas presenciais, virtuais ou por meio da troca de mensagens de texto ou áudio. Entre elas, duas vítimas de assédio sexual de Melhem, sete vítimas de assédio moral e três vítimas dos dois tipos de assédio, o sexual e o moral. Calabresa ainda tem mensagens de celular como provas dos assédios.

 

A atitude difícil e corajosa de Calabresa motivou outras mulheres, também vítimas de Melhem. Mais cinco mulheres, pelo menos, denunciaram Melhem por assédio sexual. Três delas falaram que ele costumava encostar-se nelas roçando o pênis ereto. “Ele fazia isso até quando me encontrava nos corredores. Sempre em tom de brincadeira, como se o lugar fosse apertado demais e fosse impossível não encostar em mim”, relatou uma delas. Outra atriz contou que Melhem a visitou em seu apartamento, para onde ela acabara de se mudar, quis conhecer seu quarto e, ao chegar ali, expôs sua genitália. Outra relatou que ele apareceu de surpresa em sua casa, dizendo que, ao passar casualmente pela região, resolveu visitá-la. Enquanto conversavam sobre a carreira dela na televisão, ele tentou agarrá-la.

 

Para chegar nesse ponto, no entanto, o caminho foi árduo para Calabresa. Ela denunciou os fatos para sua empregadora (Globo) várias vezes, através de diferentes instâncias, e fez isso porque conforme ia denunciando e não recebia retorno da denúncia feita e para não deixar o assunto morrer, buscava novos caminhos.

 

Calabresa fez o certo ao denunciar e ao não desistir da denúncia, porém, ao fazer isso, a cada vez que tinha que falar do assunto para as novas instâncias da empregadora ela revivia os assédios pelos quais passou, o que se torna mais uma agressão para a vítima, uma revitimização acompanhada da ojeriza de reviver, agora publicamente, a dor e o constrangimento pelos quais passou.

 

Por cada instância da empregadora Globo que Calabresa passou para denunciar os assédios, e segundo ela relatou foram pelo menos três instâncias, ela ficou horas falando, sendo indagada e respondendo, chegando a ficar cinco horas em uma dessas reuniões. A própria legislação já reconheceu o caráter maléfico e de nova agressão desse procedimento, e buscando combater isso a Lei Maria da Penha estabeleceu em seu artigo 10-A, § 1º, inciso III, a não revitimização da vítima com repetitivos depoimentos.

 

Mas a incompetência e o desrespeito da Globo em lidar com o assunto não parou por ai. Diante das denúncias a empregadora Globo não emitiu decisão e manteve o caso em sigilo, o máximo que fez até agora, após quase um ano da denúncia recebida, foi sugerir a Melhem, como resposta às denúncias de assédio, que ele fizesse terapia. Quase um presente pelos assédios praticados.

 

 E embora a Globo não tenha tomado lado, Melhem, após 17 anos na emissora, não trabalha mais na Globo após as denúncias feitas por Calabresa nas redes sociais e na imprensa. No comunicado público de desligamento de Melhem a Globo ainda fez elogios a ele e nada falou das denúncias de assédio.

 

Um chefe assediador deixa para trás, por onde passa, uma terra arrasada no que se refere aos aspectos psicológicos, mentais e emocionais da pessoa perseguida. São homens que instrumentalizam sua posição de poder hierárquico para assediar sexualmente as mulheres cujas carreiras dependem deles. Precisa de tratamento uma pessoa assim, para tratar essa mente deturpada e esse caráter covarde e apresender a respeitar que "não" é "não"? Claro, se trata de uma pessoa mentalmente doente e talvez de um psicopata, mas, para além disso, também precisa responder pelo mal  que fez, sendo responsabilizada pelos seus atos e praticando, da melhor forma, a reparação dos prejuízos.

 

E quem se omite diante de uma denúncia de assédio sexual e moral já fez uma escolha; a de ser conivente e tolerante com o assediador e o assédio, do contrário, não ficaria na omissão. A omissão é uma escolha, a escolha do não-agir e se tornar conivente. A história, por sua vez, é implacável no reconhecimento de quem fez, de quem não fez e do que foi feito. Após a atitude corajosa e das pedras no caminho, Dani Calabresa recebeu uma chuva de apoios de personalidades famosas, dentre elas, colegas de trabalho dela e de Melhem. Já Melhem perdeu o emprego, o respeito e a máscara. 

 

Raquel Montero

Dia 08 de Dezembro se comemora o Dia da Justiça


 


Hoje, 08 de Dezembro, é dia da Justiça.

 

A justiça deve ser buscada por todas as pessoas, nas suas relações consigo e com a outra pessoa, porque é com justiça que se vive em paz e sem ela não há paz nem de consciência, nem de espírito, nem social. Do mais simples ato ao mais complexo e, principalmente quando não tiver ninguém olhando, nossas atitudes devem se pautar pelo que é a justiça do caso concreto, e um exercício simples de se fazer para saber se o que estamos fazendo é justo é o exercício de se colocar no lugar da outra pessoa. E esse é o exercício da empatia também, sempre tão necessária e construtiva.

 

Nesse dia 08, então, que nos remete à reflexão da "Justiça", sigamos firmes na atitude corajosa de fazer sempre o que é o justo, que muitas vezes não será o caminho mais fácil, mas será o caminho certo, o lado certo da história, e por isso mesmo sempre valerá a pena.

 

A foto que acompanha esse texto se refere ao movimento popular do qual eu fiz parte como cidadã e como advogada voluntária na defesa de direitos humanos para protestar contra o aumento abusivo e inconstitucional de mais de 100% no IPTU de 2013, proposto pela ex-prefeita Dárcy Vera e aprovado por maioria do Legislativo Municipal da época. Eu estive desse lado da história.

 

Raquel Montero