Sempre defendi e estimulei manifestações
pacíficas, e participei de várias delas. Nunca defendi abuso ou violência, de
ambos os lados - manifestantes e poder público. Liberdade de expressão deve ser
respeitada e abusos corrigidos na forma da lei.
Nas manifestações que estão ocorrendo em várias
cidades do Brasil em função do aumento da tarifa do transporte público, não vi abuso
ou violência por parte dos manifestantes. Não vejo abuso ou violência em fazer
barricadas, parar o trânsito, aglomerar pessoas, falar em megafone e
reivindicar direitos. Se os manifestantes não tivessem agindo assim o assunto sobre o aumento da tarifa de ônibus
estaria em destaque nas mídias e na conversa das pessoas? O Poder Público teria
se incomodado com o assunto? A imprensa teria dado repercussão ao assunto? Se
as pessoas tivessem ido e vindo para seus destinos de locomoção sem essas
manifestações, teriam dado importância para o assunto?
Por outro lado
vejo sim violência e abuso do Poder Público, seja em razão da existência da
tarifa para o uso do transporte público, seja do valor cobrado por ela, seja
por utilizar da Polícia Militar (PM) para "dialogar" com os
manifestantes e "tratar" de políticas públicas, da mesma forma como
faz com a Educação, os professores, os alunos, os sem terra, e tantos outros
manifestantes de causas nobres. Vejo sim muita violência da PM nessas
manifestações, como mostra a emblemática foto acima, tirada em um dos dias de
protesto ocorrido em São Paulo, e divulgada pelo jornal Estadão.
Vejo violência
e abuso também em cobrar tarifa pelo uso do transporte público. A tarifa é uma
ofensa ao direito das pessoas, porque o transporte público é meio para se
acessar os direitos sociais elementares para uma vida digna, tais como o
trabalho, a moradia, a cultura, postos de saúde, etc. Transporte público é o
meio de acessar a própria cidade, e a cobrança de tarifa para o uso do
transporte público é um obstáculo para o acesso à esses direitos, portanto um
cerceamento de direitos.
Quando se
consulta um médico ou um dentista da rede pública, se paga antes e diretamente pela
consulta? Quando se tem aula de um professor da rede pública, se paga antes e diretamente
pela aula? Não, não se paga, porque esses serviços já foram remunerados com a
receita dos impostos, que nós pagamos. Então qual a razão para se pagar antes e
diretamente pelo uso do transporte público?
Assim, vou além
e entendo que o protesto deve ser não contra os atuais aumentos na tarifa do
transporte público, mas sim pela abolição de pagamento de tarifa para o uso do
transporte público.
Essa proposta inclusive, tem
embasamento legal, principalmente, constitucional A Constituição Federal em seu
artigo 5º diz que "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes..."
Pois bem, como falar no
direito à vida e à liberdade, sem ter condições de acessar os locais que nos
fazem viver ou termos liberdade para escolher viver, sendo estes meios a
cultura, a educação, o esporte, a saúde, a maternidade, etc?
No artigo 6º da Constituição
Federal está expresso que "São
direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o
lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à
infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição."
Como falar em qualquer
desses direitos se a pessoa não tem dinheiro para pagar a tarifa do transporte
público para ir até os locais que propiciam tais direitos?
As manifestações são legítimas porque são pacíficas e reivindicam um direito que tem como base a justiça e o pacto constitucional.
Raquel Montero
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