Raquel Montero

Raquel Montero

quinta-feira, 28 de abril de 2016

Solução para mortes é desmilitarizar a polícia


Abaixo, artigo da minha coluna no Blog do Galeno; também disponível em   http://www.blogdogaleno.com.br/ribeirao/colunista/236


Solução para mortes é desmilitarizar a polícia

No ano passado, 35% dos homicídios em Ribeirão decorreram de ações policiais. Para o Estado Democrático de Direito, é importante superar o modelo fundamentado em práticas autoritárias
No último ano, aconteceram 45 homicídios na cidade, segundo a Secretaria Estadual de Segurança. Mas a secretaria não inclui na estatística as 24 pessoas mortas pela própria polícia neste período, de acordo com dados da pasta. Essas mortes representariam 35% dos homicídios de Ribeirão Preto. Uma porcentagem alta demais, uma vez que o trabalho da Polícia, seja Civil seja Militar, deve ser o de propiciar segurança para a população e não gerar mais violência. As pessoas mortas em razão de ação policial também deveriam ser incluídas na estatística de homicídios, notadamente porque, na maioria das vezes, essas mortes resultam de ação errada da polícia, seja por incapacidade, seja por abuso.

A morte ou violência decorrente de ação policial vem justamente da falta de mais capacidade, mais preparo e sabedoria para a Polícia lidar com a situação. É como perguntar para um pai ou uma mãe que bateu em seu filho, se este ou esta tivesse mais controle da situação e mais preparo, teria batido, teria chegado neste ponto? Todos respondem que não, invariavelmente, porque sabem, mesmo que não queiram admitir, que o ato de bater, sobretudo em uma criança, é uma ação de descontrole, de falta de equilíbrio, de preparo, em resumo, uma violência. A mesma pergunta se aplica para a Polícia. Se esta tivesse mais controle da situação e mais preparo, teria batido, teria matado, teria chegado neste ponto?
Os inquéritos abertos por conta dessas mortes não têm sido bem conduzidos e nem bem explicados. Muitos deles, inclusive, têm vícios e nulidades, seja por um trabalho mal feito, seja pela falta de estrutura para realizar um bom trabalho. E ai, nesse contexto, o trabalho da investigação não dá um bom e fidedigno resultado para a sociedade.
Na avaliação de especialistas, uma segurança pública efetiva com a garantia de direitos humanos deve ser a meta. É importante o amadurecimento do Estado Democrático de Direito, de maneira que se supere o modelo de organização fundamentado em práticas autoritárias.
A Comissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas recomendou que o Brasil deveria trabalhar para extinguir a Polícia Militar. A instituição internacional ligou a PM a práticas de tortura e reconheceu que a forma como atua é propícia para a criação de “esquadrões da morte”.
Paralelo ao debate sobre a extinção da Polícia Militar, está o debate sobre a desmilitarização da mesma. A formação militar é bastante rígida e o policial vai para a rua com essa cultura rígida, tratando a sociedade às vezes de forma igualmente dura.
Os efeitos de uma polícia militarizada para a sociedade são inúmeros. A inadequação de uma corporação formada para combater inimigos reflete no tratamento dado aos cidadãos em geral. Essa agressividade vai ser transposta, em última análise, para o suspeito. Na hierarquia militar, não é o soldado que é a base da hierarquia, é o civil e, principalmente, o que é suspeito da prática de crimes.
O debate da desmilitarização é importante porque tem relação com a formação. Quando se tem uma formação em que o foco é a militarização para enfrentar a violência e todo esse contexto de crimes, é óbvio que vai deixar de se considerar outros elementos que poderiam ser parte desse enfrentamento, não apenas o enfrentamento bélico. Você deixa de trazer outras questões e, com isso, acaba caracterizando a polícia apenas de um jeito. Na missão da PM está prevista a prevenção do crime, só que a gente não vê a polícia agindo na prevenção, mas enfrentando situações muitas vezes de forma violenta, situações que mereceriam abordagem e conduta completamente diferentes do profissional de segurança. Essa resposta também tem relação com a lógica militar que rege essa polícia.
Infelizmente, essa é nossa triste realidade. A sociedade desconfia dos nosso policiais, nossos policiais estão despreparados, mal remunerados, mal assistidos e tratam o cidadão de forma desrespeitosa.

Raquel Montero


Advogada e membro do Coletivo de Mulheres para a Moradia. Escreve no Blog do Galeno Ribeirão a cada 15 dias.

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