Raquel Montero

Raquel Montero

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

O velho se faz novo

O velho se faz novo

Não é o que está fora de ti que te impede de fazer. É o que está dentro.

Buscas a razão do suplício que te faz tagarelar tolices que cansam tua fala e agridem a audição alheia, na tentativa vã de substituir com tuas palavras as omissões de teus atos.
Ligas o rádio e a televisão para não ouvir o som de teus sentimentos, e não deixar que ele se comunique com tua consciência e teu coração, que também já brigaram entre si, e sozinhos agem em monólogos descompassados e desequilibrados, porque a consciência em litígio com o coração, pensa sem compreensão, e o coração em litígio com a consciência, omite ações, transformando-se em atos de iníqua covardia.

Perambulas no bar e na farmácia a procura de panacéias milagrosas que te tragam sono mais pesado que os pensamentos que te afligem ou estímulo mais forte que o desânimo que te faz indolente.
Procuras nas liturgias o perdão para tuas faltas, que permita que continues na demagogia de teus atos perniciosos, que ganham legitimidade com o dízimo pago a outrem.

Apontas as falhas no outro, para tentar desviar o olhar de teus próprios defeitos, e ai, tropeças mais uma vez, revelando mais de ti do que do outro.
Reclamas de teu cansaço, mas tal qual o cavaleiro que abandonou as rédeas do cavalo, deixastes teu corpo dominarte com as atrações mais frívolas, que te sugam a energia e desperdiçam teu tempo.

Criticas o que assistes no mundo, mas não levantastes ainda da cadeira que te deixa mero expectador.
Sente-se vítima de traições, mas não agistes com a mesma lealdade que cobras para ti.
Quer a doçura do mel, mas teus pensamentos e palavras são atrativos de moscas.
Pregas a paz, mas com teu próprio filho gritas ao menor sinal de provocação e bate diante da desobediência.

Sofres com a ansiedade que te faz comer além da saciedade, mas repeles a solidão que te traz os momentos para a meditação, e com ela, a paciência para viver cada momento por vez.
Entristece-te com teu trabalho, mas fizestes da escolha de se enveredar pelo caminho que diz ser a rua de tua ideologia e vocação, mais uma refém das necessidades do consumo efêmero que alimenta o comércio de leilões de dignidade.

Não é o que está fora de ti que te impede de fazer. É o que está dentro.


Raquel Montero

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