Raquel Montero

Raquel Montero

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Perito premiado e benefício previdenciário negado.

Foto: Reprodução/Folha-Uol-Evaristo Sá

A população brasileira vai tomando conhecimento aos poucos, e nos últimos tempos nem tão "aos poucos", em suas vidas, das maldades já determinadas, além de outras planejadas, pelo governo golpista de Michel Temer.

Uma delas é a referente à revisão dos benefícios por incapacidade dos três milhões de brasileiros aposentados por invalidez em razão de doenças que os incapacitam para o trabalho, e cerca de 840 mil que atualmente recebem o auxílio-doença em razão de doenças que também os incapacitam para o trabalho.

O que tem de ruim em uma medida do Governo para a revisão de benefícios previdenciários?

Em tese, nada. Nesse caso, muitas coisas.

Analisando a Medida Provisória (MP) nº 739 de 2.016, editada pelo Governo ilegítimo de Temer em 07 de julho de 2.016, para fazer alterações na lei que instituiu o Plano de Benefícios da Previdência Social, e, dentre elas, para instituir um "Bônus Especial de Desempenho Institucional por Perícia Médica em Benefícios por Incapacidade", em tese, não se vislumbra maldades. Mas na prática, a lei é outra, inclusive a finalidade dela.

Se em tese a intenção do Governo, colocada na MP, é a de revisar benefícios previdenciários para verificar se eles não estão sendo usados indevidamente e por quem não precisa, na prática cai a máscara dessa finalidade e fica claro que a intenção é a de cortar, pura e simplesmente, o máximo de benefícios possíveis e impossíveis dos trabalhadores que estão se utilizando de tais benefícios.

A medida passou a ter execução no dia 08 de agosto de 2.016. Muitos segurados da Previdência Social que estão recebendo os aludidos benefícios foram convocados e mutirões de atendimento já foram feitos até hoje.

Cortando benefícios supostamente imerecidos, o Governo quer economizar R$ 6 bilhões/ano. Hoje os gastos com as aposentadorias por invalidez custam R$ 3,6 bilhões/mês e o auxílio-doença um bilhão de reais por mês.

É provável que existam benefícios em situação irregular, mas dificilmente somariam, se cortados, os R$ 6 bilhões anuais que o governo quer economizar.

Outro argumento do governo federal em favor da medida era que as despesas com esse benefício quase triplicaram em dez anos: passaram de R$ 15,2 bilhões em 2005 para R$ 44,5 bilhões em 2015. A quantidade de beneficiários foi de 2,9 milhões em 2005 para 3,4 milhões em 2015.

A medida estabeleceu ainda que o auxílio-doença teria duração máxima de quatro meses e só seria renovado se houvesse um pedido do segurado.  Até o Governo Dilma o benefício durava enquanto o médico perito determinava, porque é justamente um(a) médico(a) que deve avaliar até quando, aproximadamente, perdurará a necessidade de afastamento do trabalho, e não o Governo.

Normalmente já não é fácil o(a) trabalhador(a) passar pelas perícias feitas pelos(as) peritos(as) do INSS. O exame já é rigoroso. Na maioria das vezes o(a) trabalhador(a) tem que procurar por um(a) advogado(a) para assessorá-lo nesse trâmite, ajudando-o(a) no agendamento da perícia, na construção de laudos, exames e atestados médicos, que, invariavelmente já devem ser levados na perícia feita pelo INSS, além da própria perícia que serão submetidos no INSS pelo(a) perito(a) do próprio INSS.

Como dito, o exame já era rigoroso. O que se pretende, portanto, é um corte em massa de benefícios, atingindo doentes e inválidos para o trabalho, com o subterfúgio de "revisões" em benefícios.

E uma comprovação clara dessa desumana finalidade da medida é a "premiação" que o Governo instituiu para os(as) peritos(as) que atenderem essas revisões.

Uma "gratificação" de R$ 60,00 por cada perícia extra que os(as) peritos(as) realizarem e agilizarem, fora as que estão normalmente agendadas, é a premiação dada aos(as) peritos(as). É um estímulo ao perito para que este participe dessa medida de exclusão de direitos, e quanto mais rapidamente ele(a) examinar um paciente e acelerar esse processo de exclusão, mais gratificações acumulará.

As gratificações são um "Grato" do Presidente ilegítimo e golpista Temer aos(as) peritos(as) que assim agirem e compactuarem com mais esse golpe aos(as) trabalhadores(as).

A mesma maldade será feita com os(as) idosos(as) sem previdência e os portadores de deficiência que recebem o Benefício de Prestação Continuada. Trata-se de um salário-mínimo mensal concedido pelo Sistema Único de Assistência Social (SUAS), com recursos da LOAS (Lei Orgânica da Assistência Social), às pessoas com 65 anos ou mais, que têm uma renda mensal menor ou igual a 1/4 do salário mínimo, que não fazem jus à aposentadoria e às pessoas que são portadoras de deficiência que a incapacitem para qualquer trabalho e não contribuíram suficientemente com a previdência social para fazer jus a ser um segurado dela. Ambos previstos na Constituição e implantados nos últimos anos.

Em ambos os casos os beneficiados tratam-se de pessoas muito pobres. E não seria diferente. Mais uma vez são os financeiramente hipossuficientes os atingidos por corte de direitos. Enfim, a classe trabalhadora.

Desde que a revisão ou exclusão começou vários benefícios já foram cortados. Eu mesma, como advogada, já atendi vários casos desses. Pessoas que flagrantemente fazem jus ao benefício, mas que tiveram seus pedidos negados pelos(as) peritos(as) do INSS, mas que depois têm o direito reconhecido pelo Judiciário, numa clara comprovação da existência do direito, outrora negado pelo(a) perito(a).

Citada MP perdeu a eficácia em 04/11/2016. Mas Temer não perdeu tempo e já editou outra MP em 06 de janeiro de 2.017, a de número 767/2017. E com a nova MP a medida de exclusão e discriminação continua.

Eu lamento mas com a consciência menos perturbada do que aqueles que pediram o impeachment de Dilma e se confortaram com Temer. E infelizmente as maldades não se encerram ai.


Raquel Montero

sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

A função da advogada





      Hoje foi o último dia de minhas férias, conciliadas com o recesso do Judiciário, que também terminou seu recesso hoje. Segunda-feira volto para o escritório renovada de esperança, recarregada de energia, inspirada nas melhores utopias e fortalecida para as lutas necessárias em busca das transformações que realizem justiça social e contribuam para um Judiciário mais progressista no nosso país. E é com esses sentimentos que também retomo os artigos para o meu blog. E a propósito, falando agora sobre "a função da advogada". Torço para que gostem! Fraternos abraços e boa luta!
  

   O ordenamento jurídico brasileiro é composto de normas de natureza diferente e de diferentes esferas da federação. Acima de todas as normas, de toda a legislação brasileira, no ápice, está a Constituição Federal. Essa é a maior lei brasileira.


   Sobre o assunto a que nos remete o título desse texto, a Constituição Federal estabelece em seção exclusiva do seu capítulo IV, intitulado "DAS FUNÇÕES ESSENCIAIS À JUSTIÇA", a Seção III "DA ADVOCACIA". E nessa seção exclusiva, em artigo único, preconiza a nossa lei maior; "Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei."



   Por sua vez, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, no uso de suas atribuições estabelecidas no Estatuto da Advocacia, Lei federal nº 8.906 de 1.994, estabeleceu no Código de Ética da Advocacia, os seguintes deveres, normas e princípios a serem seguidos por todas as advogadas e por todos os advogados;



Art. 2º O advogado, indispensável à administração da Justiça, é defensor do Estado Democrático de Direito, dos direitos humanos e garantias fundamentais, da cidadania, da moralidade, da Justiça e da paz social, cumprindo-lhe exercer o seu ministério em consonância com a sua elevada função pública e com os valores que lhe são inerentes. 

Parágrafo único. São deveres do advogado: 

I - preservar, em sua conduta, a honra, a nobreza e a dignidade da profissão, zelando pelo caráter de essencialidade e indispensabilidade da advocacia; 

II - atuar com destemor, independência, honestidade, decoro, veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé; 

III - velar por sua reputação pessoal e profissional; 

IV - empenhar-se, permanentemente, no aperfeiçoamento pessoal e profissional; 

V - contribuir para o aprimoramento das instituições, do Direito e das leis; 

VI - estimular, a qualquer tempo, a conciliação e a mediação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios; 

VII - desaconselhar lides temerárias, a partir de um juízo preliminar de viabilidade jurídica; 

VIII - abster-se de: a) utilizar de influência indevida, em seu benefício ou do cliente; b) vincular seu nome a empreendimentos sabidamente escusos;2 c) emprestar concurso aos que atentem contra a ética, a moral, a honestidade e a dignidade da pessoa humana; d) entender-se diretamente com a parte adversa que tenha patrono constituído, sem o assentimento deste; e) ingressar ou atuar em pleitos administrativos ou judiciais perante autoridades com as quais tenha vínculos negociais ou familiares; f) contratar honorários advocatícios em valores aviltantes. 

IX - pugnar pela solução dos problemas da cidadania e pela efetivação dos direitos individuais, coletivos e difusos; 

X - adotar conduta consentânea com o papel de elemento indispensável à administração da Justiça; 

XI - cumprir os encargos assumidos no âmbito da Ordem dos Advogados do Brasil ou na representação da classe; 

XII - zelar pelos valores institucionais da OAB e da advocacia; 

XIII - ater-se, quando no exercício da função de defensor público, à defesa dos necessitados. 

Art. 3º O advogado deve ter consciência de que o Direito é um meio de mitigar as desigualdades para o encontro de soluções justas e que a lei é um instrumento para garantir a igualdade de todos. 


  Dessas normas se retiram nobres funções da advogada e do advogado no exercício da advocacia, na execução do Direito. A função da advogada na execução do Direito deve ser o de operar o Direito como um instrumento de promoção das transformações sociais que façam evoluir a sociedade. E para que as transformações elevem a sociedade para mais progressos e não retrocessos, a advogada deve aplicar o Direito com o único objetivo que dará ao próprio Direito e ao trabalho da advogada sentido e dignidade: a Justiça.


   E sobre a Justiça, falou Del Vecchio que a noção de justo é a pedra angular de todo o edifício jurídico. Eu mesma passei a faculdade inteira pesquisando uma definição de "justiça", que não se satisfez com a definição clássica de Ulpiano: "vontade constante e perpétua de atribuir a cada um o seu direito". 


  Não encontrei nenhum conceito absoluto, que definisse cabalmente o justo, a ser aplicado em todas as situações, de forma geral. E talvez não encontrei porque valores imateriais não se constrói a partir de conceitos materiais, ou talvez porque a justiça de cada caso concreto se faz com a análise das circunstâncias de cada caso concreto, como prega o princípio da equidade, em consonância com a dinâmica que é própria do Direito e da sociedade, e em respeito às diferenças, como prescreve o princípio da igualdade. 


   Com tais valores deve trabalhar a operadora do Direito. Tais objetivos deve buscar a advogada em seu mister. Do contrário, não seja advogada, nem advogado, pois não estará cumprindo com sua função, com a função social que lhe compete. 


   É isso que penso do Direito e tento realizar como operadora do Direito no exercício de minha profissão como advogada. A tarefa não é fácil. Reconheço as fraquezas que ainda tenho e os limites em que ainda esbarro na busca para cumprir as funções genuínas de uma advogada.


   Há 17 anos atrás, quando eu tinha exatamente 15 anos, eu queria mudar o mundo. Não sabia exatamente como fazer isso, mas eu queria. 17 anos depois eu continuo querendo, mas já sabendo há alguns anos como quero fazer isso. 


  Desde quando eu iniciei a faculdade, no 1º ano do curso, eu já me apaixonei pelo Direito, e ali senti em minhas mãos e em meu coração a convicção de que o Direito era o instrumento que eu buscava para as transformações sociais que eu queria ver acontecer.


    Eu sempre estudei em escola pública, e foi no ensino médio, vivendo mais uma greve anual dos professores, diante de tanta coisa errada, que iniciei minhas primeiras manifestações, buscando com meus colegas e professores uma educação de qualidade para todos. Foi ali que comecei a tomar consciência política da necessidade de mudanças e do poder que cada um de nós carrega para influenciar nas mudanças.





 Terminei o ensino médio alimentando ainda mais os ideais que eu vinha construindo. Sempre acreditei que é possível mudar para melhor, que é possível todos terem as mesmas oportunidades e viverem de uma forma digna, com o melhor que a vida pode nos oferecer. E assim, do movimento estudantil, comecei a me engajar em outros movimentos sociais. 


 Do que eu já havia vivido no movimento estudantil e nos movimentos sociais que comecei a me engajar, já tinha a certeza de que eu não queria me conformar diante das desigualdades sociais, e para tanto eu queria um instrumento que me habilitasse a contribuir para as transformações necessárias para uma sociedade justa.



Foi assim que escolhi fazer Direito, porque enxerguei no Direito um forte e poderoso instrumento para transformações, e, dessa forma, o caminho para seguir meus ideais. Através da lei vi que a operadora do Direito pode fazer justiça. Ingressei, então, na universidade, em 2003, e ali um novo mundo de aprendizados começou, foi como se eu estivesse juntando peças para um novo "eu", para, com mais conhecimento e experiência, continuar a trilhar o caminho que eu já acreditava tanto. Conciliei ali meus ideais com minha formação profissional. 


E assim, desde 2.008 quando comecei a advogar, após concluir a faculdade em 2.007,  busco realizar esse ideal todos os dias no exercício de minha profissão, que enxergo não só como uma profissão, mas sim, e principalmente, como uma missão, uma vocação, um serviço público, uma função social, exatamente como preconiza o Estatuto da Advocacia no parágrafo 1º do seu artigo 2º.


Raquel Montero

sábado, 31 de dezembro de 2016

Feliz 2017



  2016 foi um ano para mostrar o quanto podemos viver contrastes nos mais diferentes aspectos de nossas vidas. Falo de mim mesma.

  Em vários aspectos pessoais de minha vida, 2016 foi fabuloso, brilhante, realizador. No aspecto das utopias, sonhos coletivos e projetos sociais, vivemos um ano terrível, marcado por um golpe de Estado que afrontou e feriu nossos melhores sonhos de uma sociedade melhor. E não teve como não sofrermos o ataque desse golpe em nossas próprias vidas. Dilma não foi deposta sozinha. Foram milhões golpeados junto com ela com um falso impeachment.

  Mas penso que os contrastes sejam mais um sinal da esperança, para mostrar que se houve o que foi bom, é porque é possível ser bom em tudo. É possível todos nós vivermos em todos os aspectos o usufruto do que a vida tem de melhor.

  E para o golpe de Estado que vivemos em 2016, que foi o pior contraste, falo para todos o que estou falando para mim mesma desde quando Dilma foi deposta, reproduzindo uma mensagem que embalou novos sonhos e inspirou belas realizações no decorrer da história; "...sei que uma dor assim pungente não há de ser inutilmente. A esperança dança na corda bamba de sombrinha..."

  Desejo que em 2017 estejamos com as forças e a esperança renovadas para mostrarmos que a dor do golpe que vivemos em 2016 não foi inútil, só fez aumentar a luta por dias melhores para todos.

  Feliz 2017

  Fraternos abraços,
  Raquel Montero

sábado, 24 de dezembro de 2016

Feliz Natal

   

    Desejo um Natal de reflexão a todos.

  Que o novo golpe de Estado que sofremos em 2016, que usurpou nossos direitos, feriu nossa democracia e afrontou nossos melhores sonhos, nos tragam as lições necessárias que nos amadureça propiciando sementes para dias melhores. Dias que se realizem, por cada um e nós, como realizou o aniversariante dessa data. E talvez exatamente por isso o aniversário de Jesus seja relembrado e festejado todo ano, a mais de dois mil anos e pelos mais diferentes povos. Ele viveu o que pregou. Eis sua diferença e seu caráter tão especial.

  Em tempos de golpe contra o povo, essa data pode nos render novos bons ensinamentos. Os argumentos de Jesus foram contundentes, mas foram seus exemplos que tocaram corações e despertaram consciências. E essa constatação é uma das lições que podemos retirar desse dia; nossos esforços nunca são em vão, o tempo sempre guarda lugar e oportunidade para que frutifiquem.

  Feliz Natal

sábado, 3 de dezembro de 2016

Feliz por estar presa a prefeita de sua cidade?

Foto: Reprodução/EPTV



    Eu não fico feliz. Eu lamento. Ficaria feliz se a prefeita da minha cidade tivesse sido premiada por ter desempenhado a melhor gestão municipal dos últimos anos. Ai sim, eu ficaria muito feliz.


   Agora, ficar feliz por ter sido presa a representante máxima da cidade em que vivo, em que cresci, da cidade que amo, e ter sido presa por supostas práticas de crimes de corrupção em detrimento do dinheiro público, ai não. Isso é muito deplorável. É de se lamentar. 


   É de se lamentar também tendo em vista que ninguém sai melhor dos estabelecimentos penais do nosso país, e de muitos outros países. Estão ai os altos índices de reincidência para comprovar que se cadeia ou prisão estivesse sendo eficiente não produziria reincidência e não faria com que o Brasil estivesse em quarto lugar em maior população carcerária. Atualmente temos mais de 600 mil presos e presas no Brasil e uma das mais altas taxas de reincidência do mundo. 


   É claro que os crimes devem ser punidos e os(as) criminosos(as) responsabilizados(as). Concordo plenamente com isso. Mas também defendo que a pena deve ser aplicada e cumprida de maneira a cumprir a função para a qual foi criada e se justifica, como preconiza a lei. A pena deve servir para prevenir o crime e ressocializar o(a) condenado(a). 


   Desafio qualquer pessoa a me mostrar que as penas aplicadas no Brasil cumprem essa finalidade. Eu "truco" se alguém me mostrar isso. Na prática, penas e estabelecimentos carcerários são escolas do crime a reproduzirem a prática criminosa. Tem dúvida? Vai em algum presídio constatar.


   Portanto, como se vangloriar, se felicitar com uma prisão nesse contexto?


   Que as penas sejam aplicadas, que as pessoas sejam responsabilizadas, que a justiça seja feita, mas que tudo isso aconteça com o fim de verdadeiramente ressocializar o(a) condenado(a). Se não que Justiça será essa que faz de criminosos(as) e condenados(as) pessoas piores ao estarem sob a custódia do Estado quando cumprem penas?


   Acho deplorável tudo que está acontecendo com a Prefeita de Ribeirão Preto, minha cidade. Preferia que ela estivesse sendo premiada por ter feito uma boa gestão para a cidade. Deplorável também tendo em vista a história de superação de Dárcy.


   Dárcy é da cidade de Indiaporã. Começou a trabalhar desde muito nova na colheita de algodão. Veio para Ribeirão aos 17 anos, período em que trabalhou como empregada doméstica. Depois trabalhou como radialista, e na sequência iniciou-se na política. Foi quatro vezes vereadora, sendo seu primeiro mandato em 1.995 quando assumiu a suplência do até então vereador Fernando Chiarelli, que foi cassado. Em 2.004, para seu quarto mandato, Dárcy foi a vereadora mais votada, com 27.787 votos. Em 2.006 foi eleita deputada estadual com 140.712 votos, sendo a deputada mais votada entre todos os estados do Brasil. Em 2.008 foi eleita prefeita de Ribeirão e logo no primeiro turno, sendo a primeira mulher eleita prefeita de Ribeirão. Em 2.012 foi reeleita prefeita de Ribeirão, entrando para a história também como a primeira Chefe do Executivo a ser reeleita na cidade. 


   E agora, depois dessa trajetória, Dárcy não termina o segundo mandato ao ser presa no dia 02 de dezembro de 2.016, entrando para a história do município, mais uma vez, como a primeira prefeita da cidade a ser presa. 


   Ela está sendo acusada pela práticas de vários crimes, todos eles envolvendo corrupção com o dinheiro público.


   Se fico triste em ver denúncias de corrupção, fico feliz, ao mesmo tempo, que a corrupção esteja sendo investigada, descoberta e punida. Assim deveria ser sempre, com todos, em todas as circunstâncias, independente de partido, de ideologia, de cor, de classe social, enfim, com imparcialidade.


  Todavia, verificamos que ainda não estamos nesse estágio de imparcialidade. Se tivéssemos, Duarte Nogueira (PSDB) não teria sido eleito prefeito de Ribeirão para os próximos quatro anos na mesma época em que foi citado em denúncias de corrupção em operações para compra de merenda escolar, e na mesma época em que seu partido, o PSDB, é o campeão de políticos fichas sujas. 


   E dentre outras reflexões que esse episódio triste da Prefeita Dárcy Vera nos remete, lembro que os atos de corrupção que estão sendo atribuídos à Dárcy, se o Judiciário concluir que de fato ocorreram, não foram praticados só por ela, assim como o gatilho da arma do policial militar que não é apertado só por ele.


   Nos atos em que ela está sendo acusada, necessariamente, teve que existir quem concordou e aceitou a corrupção a que ela está sendo acusada. Ou seja, Dárcy não chegou lá e nem conseguiu realizar os supostos esquemas sozinha. Muitas pessoas contribuíram e participaram.


  Em primeira instância da culpa ou conivência muitas outras pessoas são culpadas por Dárcy ser a prefeita de Ribeirão. O voto de muitos(as) a colocou lá. Se não fossem esses votos ela não seria prefeita. As pessoas que votaram nela também são responsáveis pela situação em que estamos. 

   Raquel Montero

terça-feira, 15 de novembro de 2016

Direitos em ocupações em instituições de ensino e deveres das autoridades em respeitá-los

   
Fotos/Arte: Reprodução/Revista GGN

 Não preciso explicar sobre as ocupações que estão ocorrendo em escolas e universidades de todo o Brasil por estudantes que estão utilizando do ato de ocupação para protestar contra as medidas tomadas pelo ilegítimo presidente Michel Temer para a Educação no País. Não é novidade para ninguém essas ocupações, então não vou ser redundante aqui. 


   O objetivo desse texto é falar dos direitos das(os) estudantes nas ocupações e dos deveres das autoridades em respeitar esses direitos, buscando assim, também, contribuir com o sucesso das ocupações.



   Com esse objetivo, eu, cidadã, sempre aprendiz e advogada, também expresso minha total concordância com as mencionadas ocupações, e meu desejo no sucesso delas. Estou do lado das(os) estudantes.  



     No Brasil impera a proteção integral dos direitos das crianças e adolescentes, sendo dever do Estado, da família e da sociedade assegurar, com absoluta prioridade, o direito à vida, à dignidade, ao respeito e à liberdade deles. Tais determinações estão na lei maior do Brasil, a Constituição Federal, nos tratados e convenções internacionais em que o Brasil é signatário e no Estatuto da Criança e do Adolescente.


     A lei maior do Brasil também  determina que o ensino público tem como princípio a gestão democrática (art. 205, VI).


    Nesse sentido, então, é absolutamente legítima a manifestação das(os) estudantes para que sejam ouvidos em medidas e projetos relacionados à Educação, e, ao mesmo tempo, são ilegítimas medidas e projetos que não respeitem a gestão democrática da Educação no Brasil e tente fazer imposições. 


    As ocupações, portanto, ocorreram e ocorrem como decorrência de um direito que não foi respeitado (gestão democrática da Educação), e como forma de protestar contra o desrespeito e a arbitrariedade.


    A manifestação, por sua vez, também é um direito assegurado pela mesma lei maior do Brasil, que estabelece;


“É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” (Constituição Federal, artigo 5º, inciso IV). 

“Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente” (Constituição Federal, art. 5º, XVI). 

“É plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar” (Constituição Federal, art. 5º, XVII).


      Como corolário desses direitos, temos ainda os seguintes direitos estabelecidos na Constituição Federal e pertinentes à utilização em ocupações;


Todo cidadão/ã pode exercer a liberdade de expressão também por meio de equipamentos de comunicação.  Ninguém é obrigado a fornecer senha ou liberar conteúdos (fotos ou áudios, por exemplo) sem ordem judicial;


Você tem direito a ser revistado/a por policial do mesmo sexo que o seu. Qualquer revista da polícia, inclusive em objetos como mochilas, deve ser feita na presença de todos/as;


A reintegração de posse somente pode ser realizada mediante a apresentação de decisão judicial autorizando o ato. Assim, é importante solicitar ao oficial de justiça que apresente o respectivo mandado judicial, bem como verificar se a ordem determina a imediata desocupação com uso de força policial, ou se é concedido prazo para cumprimento espontâneo dessa obrigação;


O uso de força policial deve se pautar pela defesa dos direitos humanos (Portaria Interministerial N° 4.226/2010). As ordens que determinem o uso da força precisam ser dadas identificando o nome de um responsável, bem como instruções precisas da ação;


 Policiais precisam estar identificados;


Pessoas só podem ser presas em caso de flagrante de infrações penais ou por ordem judicial, por isso pergunte a razão da detenção demonstrando que não está com isso resistindo à prisão, mas sim, querendo saber o motivo dela;


 A pessoa detida deve ser conduzida para a Delegacia de Polícia (DP). Até lá, evite contestar o Policial Militar, que deve apenas leva-lo/a à DP. A investigação é feita pela Polícia Civil. Ao chegar ao local, exija a presença de um/a advogado/a ou defensor/a público;


A Resolução 06/2013 do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH) preconiza que as ações das autoridades públicas em manifestações devem defender e respeitar direitos humanos, recomendando que ocorram com meios não violentos e sem o uso de armas de fogo nessas situações, e mesmo armas consideradas de "baixa letalidade", como balas de borracha, só podem ser usadas quando ficar comprovada sua necessidade para a garantia da integridade física dos agentes. A recomendação destaca que “não deverão, em nenhuma hipótese, ser utilizadas por agentes do Poder Público armas contra crianças, adolescentes, gestantes, pessoas com deficiência e idosas”;


A Lei 13060, de 22 de dezembro de 2014, que disciplina o uso dos instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública, fixa que não é legítimo o uso de arma de fogo contra pessoa que não represente risco imediato de morte ou de lesão aos agentes de segurança pública ou a terceiros;


É dever de todos/as proteger o patrimônio público. A prática de destruição, inutilização ou deterioração de coisa alheia é considerada crime (Código Penal, art. 163). 


É muito comum acontecer de pessoas serem presas em manifestações sob a justificativa de terem desacatado funcionário público, no caso, policial militar. O desacato está previsto como crime no Código Penal Brasileiro, no artigo 331 dele. No entanto, há o entendimento também de que a prisão de alguém em razão de desacato não pode ser feita, pois viola a Convenção Americana sobre os Direitos Humanos; 


 O policial e outros servidores estão sujeitos ao controle social. A utilização de equipamentos de gravação (celular, câmera, máquina fotográfica, etc.) para o registro da atividade deles não deve ser entendida como desacato;


Todas as pessoas tem direito ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório em processos judiciais ou administrativos, e em todas essas circunstâncias com a assistência, acompanhamento e defesa de um(a) advogado(a);


Todas as autoridades envolvidas de alguma forma nos direitos aqui citados, como juiz(a), oficial(a) de justiça, representantes do Ministério Público, policial militar, delegado(a), policial civil, etc, tem o dever de respeitá-los, e qualquer desrespeito à esses direitos, bem como abusos e arbitrariedades podem ser denunciados para responsabilização dos agentes públicos que agiram errado.



Sucesso às ocupações! É o meu desejo.


Raquel Montero
    

quinta-feira, 3 de novembro de 2016

A eleição de Nogueira, e como se vence uma eleição



Neste domingo, 30 de outubro de 2.016, ficou definido o cenário político do governo municipal de Ribeirão Preto para os próximos quatro anos.



Com 13,88% de diferença, o ex-Deputado Federal e ex-Secretário Estadual de Transportes e Agricultura do Estado de São Paulo, Duarte Nogueira (PSDB), venceu a disputa do 2º turno contra o candidato Ricardo Silva (PDT).



Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Nogueira teve 56,94% dos votos válidos, o que redunda em 147.705 mil votos, e Ricardo 43,06%, o que redunda em 111.697.



Porém, Nogueira não foi eleito pela maioria dos(as) eleitores(as) de Ribeirão, ao contrário, a maioria dos(as) eleitores(as) não votaram em Nogueira.



Só os votos nulos, brancos e abstenções que somam 175.979 mil votos, também somam mais do que os votos recebidos por Nogueira. Tivemos 27,62% de abstenção nesse 2º turno. Foi a maior abstenção do País entre os 57 municípios que tiveram 2º turno. Percentual não muito diferente do 1º turno em Ribeirão, que ficou com 25,2% de abstenção.




111.697 votos foram destinados ao outro candidato, vencido no 2º turno.



Somando os votos brancos, nulos e abstenções (que totalizam 175.979 mil votos), mais os votos destinados ao outro candidato (111.697 mil votos), temos um total de 287.676 mil votos que não foram destinados para o candidato eleito.




Ribeirão tem 435.381 mil eleitores(as). Abstraindo de 435.381 os votos destinados ao candidato eleito (147.705), temos que 287.676 eleitores(as), que corresponde a mais de 66% do eleitorado de Ribeirão, não votou no candidato eleito Nogueira.



Em outras palavras, Nogueira foi eleito por tão somente 34% do eleitorado de Ribeirão.



Mas, enfim, como com base na legislação eleitoral só se computam os votos válidos, na análise desses Nogueira conseguiu a maioria, e por isso foi eleito.



Repito aqui, o que eu já disse acerca da democracia nas eleições dos candidatos à vereança de Ribeirão. Ainda não podemos dizer que o resultado de nossas eleições municipais foi democrático em razão de vários fatores que restringem ou impossibilitam a democracia, senão vejamos;



-   a falta de acesso a internet, a jornais, a televisão para instruir as pessoas;


-  a ausência de escola de qualidade para a educação e formatura das pessoas;


-  o desinteresse das pessoas pela vida política;


-  a barganha que se faz com o voto, seja por interesse particular egoísta de alguns, seja por necessidade financeira de muitos;  



-  a disparidade  econômica dos(as) candidatos(as) que concorrem às eleições. No Brasil o financiamento de campanhas políticas pode ser  de fundos públicos e de origem particular, e, dessa forma, candidatos que podem contar com particulares que queiram financiar suas campanhas políticas tem vantagem sobre os(as) candidatos(as) que não podem contar com tal medida. Nesse sentido sabemos que o candidato eleito teve gastos de campanha eleitoral bem maiores que a maioria dos demais candidatos ao Executivo Municipal, situação que o coloca em condição de superioridade sobre os demais candidatos e ratifica desigualdade de condições na competição eleitoral. Poder contar com mais instrumentos para a campanha traz sempre mais chances de sucesso nos resultados, isso é óbvio;



 grande coligação que o partido de Nogueira fez, contando com 07 partidos coligados. Veja, por exemplo, o PT só coligou com um partido, o PCdoB. Há uma grande diferença entre 02 partidos coligados e 07 partidos coligados.




Todos esses fatores contribuem não só para a eleição mas também para um voto desapegado de significado e que não representa a vontade legítima do povo, e a porcentagem de votos não destinados para a eleição de Nogueira corrobora essa afirmação (66%).




Por derradeiro, esse é o resultado que temos e, pela lei atual que temos, democrático ou não, temos que aceitá-lo.




Críticas há e houveram várias, desde a vida pregressa de Nogueira, seu partido político (PSDB) até o resultado efetivo que ocorreu no domingo (Nogueira foi citada na investigação que apura esquema de fraude e corrupção na venda de produtos agrícolas para a merenda de escolas municipais e estaduais, votou a favor da PEC 241, votou a favor do impeachment da Presidenta Dilma, foi chamado de machista ao citar a vida amorosa de uma colega deputada federal durante os trabalhos na Câmara dos Deputados, e por ai vai...)



A crítica, inclusive, reforça a fiscalização que deve ser feita sob a gestão pública e os gestores públicos. Se a eleição tem que ser respeitada, a fiscalização, principalmente para aqueles que discordaram do resultado, tem que ser reforçada.



Para as mentes progressistas, há o que se lamentar (e muito), todavia, apesar de e acima de tudo, o tempo é de trabalho, de resistência, de luta, de militância, de identificar os erros e aprender com eles. É tempo de LUTA. É tempo de CIDADANIA.



Passemos a exercer nossa cidadania rumo ao que queremos de melhor para a cidade, para o país, e assim, quiçá, conseguiremos fazer também a reforma política que pode estabelecer a real democracia nas eleições futuras, e assim, um resultado que agrade, senão a todos, à legítima maioria.


Raquel Montero