Por Raquel Bencsik
Montero
Objetivando o respeito
aos direitos consagrados na Constituição Federal, fiz uma carta dirigida à
Prefeita Darcy Vera onde foi relatado as condições atuais de uma comunidade que
vive numa favela de Ribeirão Preto, conhecida como Núcleo da Avenida João
Pessoa (abaixo, íntegra da carta).
A carta teve adesão de entidades
e movimentos sociais de Ribeirão Preto e a cobertura da imprensa que deu
divulgação ao ato (notícias e imagens abaixo).
Em suma objetivou-se
notificar a Prefeita das condições da favela mencionada, destacando a existência
de crianças, adolescentes, idosos e deficientes moradores da favela e o tempo
de permanência das pessoas naquela terra, redundando para os moradores no
direito a usucapir a terra em que estão morando e assim, qualquer desocupação
que se faça naquela área, tendo em vista a ameaça de desocupação, que não se faça
sem o resguardo dos direitos individuais e sociais previstos para a situação.
Por fim, encaminhei cópia
do protocolo da carta dirigida para a Prefeita ao Ministério Público, à
Defensoria Pública, à OAB e à Vara da Infância, Juventude e Idoso de Ribeirão
Preto, para que nenhum desses órgãos e entidades aleguem desconhecimento da
situação, bem como para que acompanhem os fatos e tomem as providências necessárias.
Ribeirão Preto, 27 de fevereiro de 2.012.
À Excelentíssima
Prefeita de Ribeirão Preto, Senhora Darcy Vera;
Em
atenção ao receio de muitas famílias que vivem na favela do bairro Jardim
Aeroporto, conhecida como Núcleo da Avenida João Pessoa, localizada na zona de
ruídos 1 e 2 do aeroporto, na divisa dos bairros Jardim Aeroporto e Jardim
Jóquei Clube, de serem as favelas em que moram desocupadas para reintegração de
posse daquelas terras, sem que antes se disponibilize moradia digna para todas
aquelas famílias, bem como o atendimento de todos os direitos a que fazem jus
aquelas famílias, sendo estes, os direitos individuais e sociais preconizados
pela Constituição Federal e considerando;
que,
assim como o direito à propriedade, ao meio ambiente (animais e flora) e ao
ordenamento urbano, também a dignidade da pessoa, a segurança e a moradia estão
igualmente tutelados pela Constituição Federal;
que a
dignidade da pessoa se refere ao atendimento dos direitos individuais e sociais
preconizados pela Constituição Federal, sendo estes, respectivamente, o direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, à propriedade, à educação, à
saúde, à alimentação, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à
previdência social, à proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados;
que o
direito à propriedade não se sobrepõe ao direito à dignidade;
que a
dignidade da pessoa humana foi eleita como valor supremo na Constituição
Federal de 1988, devendo ser observada com prioridade na ponderação com demais
direitos da pessoa, tais como o direito à propriedade;
que o
respeito ao meio ambiente, animais e flora, estão, assim como o direito das
pessoas humanas, igualmente tutelados pela Constituição Federal;
que,
segundo levantamento da Associação Comunitária de Moradores do Jardim
Aeroporto, realizado entre os dias 10 e 11 de fevereiro de 2.012, a favela da Avenida
João Pessoa é habitada por 310 pessoas, sendo 111 crianças, 40 adolescentes, 20
idosos e 08 deficientes e enfermos;
que
existem 91 moradias nessa favela e que o tempo de ocupação das pessoas que
vivem nessa favela está dentro de um
período de tempo compreendido entre 01 e 30 anos e ao mesmo tempo as terras
ocupadas se referem a propriedade particular, o que possivelmente dá ensejo à
usucapião da terra e não à reintegração dela por parte do proprietário
particular;
que
não estão incluídas em programas habitacionais 70 famílias que moram nessa
favela, o que totaliza 248 pessoas;
que
por expressa previsão legal, notadamente do Estatuto da Criança e do
Adolescente e do Estatuto do Idoso, crianças, adolescentes, idosos e gestantes
têm prioridade de proteção e proteção absoluta em quaisquer situações, e que,
assim sendo, não podem ter seus direitos individuais e sociais ameaçados, por
menor que seja essa ameaça, devendo ficarem absolutamente resguardados seus
direitos em todas as situações;
que
para que haja a desocupação de favelas é necessário antes que se tenha atendido
a todos os direitos individuais e sociais que a Constituição Federal preconiza,
não podendo haver remoção sem que o amparo à esses direitos esteja garantido;
que a
preterição de tais postulados conduzirá invariavelmente, não à extinção das
favelas, mas sim, à sua perpetuação e deslocamento delas de um a outro ponto da
cidade;
que o
uso da violência na desocupação das favelas não resolverá o problema da fome,
da miséria, da moradia e do ordenamento urbano, e que as melhores soluções são
as construídas multilateralmente, com o concurso de todos os envolvidos e de
entidades pertinentes;
que o
concurso de todos os envolvidos, incluindo entidades e órgãos pertinentes, nas
questões de ocupação de terras e reintegrações das terras ocupadas está
preconizado pelo Estatuto das Cidades, assim como a regularização fundiária e
urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda, desapropriação,
referendo popular e plebiscito, como instrumentos da política urbana que
regulamentam os artigos 182 e 183 da Constituição Federal;
que os
casos de reintegrações de posse em áreas favelizadas são por excelência a mais
flagrante demonstração de disputa entre partes altamente desiguais: os que tem
pluralidade de posses e os que sequer têm atendidos os mais elementares
direitos humanos;
que a
ocupação de terrenos para formação de favelas não tem por fim a especulação nem
locupletamento, tampouco é feita por escolha, mas por falta de opção;
que a
questão das favelas se trata de um problema social complexo e não de um crime,
devendo ser resolvida com políticas públicas e não com violência;
que o
Brasil é signatário de diversos pactos internacionais que, por sua vez, também
estabelecem o respeito à integridade física e moral das pessoas, à dignidade, à
proteção absoluta das gestantes, das crianças, dos adolescentes, dos idosos e
deficientes, o direito à moradia e a todos os demais direitos sociais que a
nossa própria Constituição Federal prevê, bem como a proteção aos animais que
também vivem em favelas;
que o
compromisso do Brasil assumido nesses diversos instrumentos internacionais
devem ser cumpridos, não só como conseqüência do pacto realizado, mas como
boa-fé em suas atitudes nacionais e internacionais e que o descumprimento
desses compromissos, como foi o caso da
Favela da Família em 05/07/2011 em Ribeirão Preto , acarreta nefasto resultado no cenário nacional
e internacional, incluindo ainda, má repercussão financeira para o Brasil,
decorrente do boicote internacional nas comunicações e transações econômicas;
os
signatários deste documento vêm registrar nessa Prefeitura de Ribeirão Preto,
as condições em que se encontram as famílias do Núcleo da avenida João Pessoa, aludidas
acima, dando ciência assim para que não se alegue desconhecimento, objetivando
dessa forma que nenhuma desocupação seja feita naquela favela sem que os
direitos individuais e sociais estabelecidos na Constituição Federal, e já
expressamente mencionados aqui, e a que fazem jus todas as pessoas, bem como os
direitos dos animais que também vivem nessa favela, sejam respeitados, levando
cópia do protocolo deste documento ao Ministério Público, à Defensoria Pública,
à Ordem dos Advogados do Brasil e à Vara da Infância e da Juventude do forum de
Ribeirão Preto, para as providências necessárias.
A
dignidade e os direitos da pessoa e dos animais devem sempre ser observados,
principalmente pelo Poder Público. Se na execução dos atos públicos ainda se
vislumbra qualquer mínima ameaça à dignidade e aos direitos, é porque ainda não
se encontrou o melhor caminho e sendo assim, ainda é tempo de ponderar até que
se chegue no melhor, que se traduz como respeito à todos e ao meio em que todos
estão inseridos.
Contamos
com o respeito de Vossa Excelência aos direitos consagrados constitucionalmente
e assim com o respeito à própria Constituição Federal e demais leis dela
oriundas.
ASSINAM: Raquel Bencsik Montero, Mauro Freitas, Associação Comunitária
de Moradores do Jardim Aeroporto, Movimento Pró Moradia e Cidadania, Movimento
Por uma Ribeirão Melhor, Movimento Pró Novo Aeroporto de Ribeirão Preto e
Região, Federação dos Trabalhadores das Empresas de
Correios e Telégrafos, CAP Quintino.
Matéria no Jornal da Clube:
http://www.jornaldaclube.com.br/videos/4754/protocolada-uma-carta-em-defesa-dos-moradores-de-uma-favela-no-jd.-a
Matéria no jornal "Gazeta" de Ribeirão Preto, em 27/02/2012:
Matéria no jornal "A Cidade", em 28/02/2012:
Protocolos: